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Variabilidade espacial e temporal da precipitação pluviométrica na bacia hidrográfica do rio Tapajós
Spatial and temporal variability of the rainfall in the Tapajós river basin, Brazil
Revista Presença Geográfica, vol. 07, núm. 03, 2020
Fundação Universidade Federal de Rondônia

Artigos

Revista Presença Geográfica
Fundação Universidade Federal de Rondônia, Brasil
ISSN-e: 2446-6646
Periodicidade: Frecuencia continua
vol. 07, núm. 03, 2020

Recepção: 18 Maio 2020

Aprovação: 09 Janeiro 2021

Resumo: Esta pesquisa apresenta a variabilidade espacial e temporal da precipitação pluviométrica na Bacia Hidrográfica do rio Tapajós. A partir da caracterização da área de estudo analisou-se, à luz dos conhecimentos geográficos e da perspectiva sistêmica, a precipitação pluviométrica para o período de 2000 a 2017, com dados de 103 postos pluviométricos obtidos na plataforma HidroWeb, ferramenta integrante do Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos – SNIRH. Obteve-se a média de precipitação de 2019,0 milímetros anuais e determinou-se os anos chuvoso (2013), mais seco (2015) e habitual (2003) do período estudado para maior detalhamento da distribuição anual e dividiu-se os anos em período menos chuvoso (meses de maio a outubro) e mais chuvoso (janeiro, fevereiro, março, abril, novembro e dezembro). A partir da confecção de mapas de isoietas gerados por meio da interpolação dos dados da bacia em ambiente SIG (Sistema de Informação Geográfica) percebeu-se um gradiente pluviométrico no sentido norte-sul da bacia, com valores mais elevados em latitudes menores e menos elevados em maiores latitudes. Além disso, a região do Alto Tapajós destaca-se pelos mais altos totais pluviométricos registrados na área de estudo.

Palavras-chave: Planejamento ambiental, recursos hídricos, precipitação pluviométrica, variabilidade espacial, variabilidade temporal.

Abstract: This research presents the spatial and temporal variability of the rainfall in the Tapajós river basin. Starting with the characterization of the study area and based on the geographic knowledge and the systemic perspective, the rainfall was analyzed from 2000 to 2017, with extracted data from 103 pluviometric stations obtained on HidroWeb platform, created by the National System of Information on Water Resources (Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos – SNIRH). 2019.0 annual millimeter precipitation was obtained and the rainy (2013), drier (2015) and usual (2003) years of the studied period were determined for further details of the annual distribution and the years were divided into the least rainy (months from May to October) and the rainiest (January, February, March, April, November and December). From the making of isohyets maps generated by interpolating the basin data in a GIS (Geographic Information System) environment, a pluviometric gradient was noticed in the north-south direction of the basin, with higher values in lower latitudes and less elevated at higher latitudes. In addition, the Alto Tapajós region stands out for the highest pluviometric recorded in the study area.

Keywords: Environmental planning, water resources, precipitation, spatial variability, temporal variability.

1. INTRODUÇÃO

O processo de industrialização e o avanço das técnicas de trabalho da sociedade humana vêm alterando a natureza de forma progressiva em prol da apropriação econômica, em um cenário antagônico entre os interesses socioeconômicos e a necessidade de preservação do meio ambiente.

Este panorama é refletido na bacia hidrográfica do rio Tapajós, uma das mais ameaçadas, segundo Cheng et al. (2013), por projetos de empreendimentos hidrelétricos construídos e em planejamento na Amazônia, sinalizando um cenário preocupante de degradação. De acordo com o artigo, há 90 barragens planejadas e 28 existentes na área, podendo afetar o rio Tapajós e seus principais tributários, impactar os ecossistemas aquáticos e a biodiversidade da bacia, além de ameaçar a existência de espécies únicas de peixes e aves.

Diante disso, as mudanças ambientais têm recebido destaque nos estudos científicos no âmbito nacional e internacional, acompanhando a percepção da sociedade da necessidade em conhecer os impactos que as atividades socioeconômicas trazem para o meio natural e os consequentes problemas que possam acarretar aos seres humanos.

Assim, revela-se a importância da produção geográfica no estudo detalhado do ambiente natural de sobrevivência do homem e das diversas relações que este estabelece.

A procura de soluções alternativas para o desenvolvimento econômico, com justiça social e racionalização do uso dos recursos naturais que atenue os impactos ambientais, é o rumo a ser perseguido pelas sociedades atuais e futuras. Isso deve ser objeto de preocupação da Geografia, ajudar a encontrar o caminho para o desenvolvimento sustentável (ROSS, 2014, p. 16-17).

Trilhando este caminho e valendo-se das contribuições que a Climatologia traz à compreensão do clima enquanto elemento de análise para o planejamento ambiental, a água merece destaque. Bem essencial à manutenção da vida no planeta e recurso natural fundamental no desenvolvimento humano,

falar da relevância dos conhecimentos sobre a água, em suas diversas dimensões, é falar da sobrevivência da espécie humana, da conservação e do equilíbrio da biodiversidade e das relações de dependência entre seres vivos e ambientes naturais (BACCI; PATACA, 2008, p. 211).

Os usos da água são inúmeros. Além da manutenção da vida animal e vegetal no planeta, pode ser considerada um recurso, à medida que é destinada à produção energética e aos usos doméstico, agrícola e industrial; além de usos não consumptíveis, como o viário, o turismo e o lazer. Seu uso cresceu intensamente ao longo do tempo, a despeito do acelerado crescimento demográfico do século XX (VENTURI, 2018, no prelo).

Objeto de estudo do presente trabalho, a chuva é um dos diversos tipos de precipitação existentes na atmosfera, resultado da “condensação na atmosfera que cai em direção ao solo, quando o peso das gotas supera as correntes verticais de ar” (YNOUE, et al., 2017, p. 46). Principal transferência de água da atmosfera até a superfície terrestre, é parte do fenômeno global de circulação fechada da água entre a superfície terrestre (continentes e oceanos) e a atmosfera, chamado de ciclo hidrológico. Impulsionado fundamentalmente pela radiação solar associada à gravidade e à rotação da Terra, compreende a circulação de água no interior e na superfície (nos solos, rochas, oceanos e seres vivos), a água que circula na atmosfera (microgotículas de água, umidade, partículas de gelo) e o intercâmbio entre superfície e atmosfera, com os fluxos de água em forma de vapor no sentido superfície-atmosfera e, no sentido atmosfera-superfície, em qualquer estado físico, sendo mais significativas as precipitações de chuva e neve (SILVEIRA, 1993, p. 35-36).

Para o estudo do fenômeno da precipitação pluviométrica, julga-se adequada a utilização da bacia hidrográfica enquanto escala de análise. A partir da abordagem sistêmica do funcionamento dos elementos naturais do planeta, o trabalho se direcionará à análise da bacia hidrográfica do rio Tapajós, de forma a entender as relações determinantes na distribuição e variabilidade do fenômeno da precipitação pluviométrica na área escolhida.

Por serem consideradas “um sistema físico onde a entrada é o volume de água precipitado e a saída é o volume de água escoado pelo exutório” (SILVEIRA, 1993, p. 41), as bacias hidrográficas dependem de diversos elementos que compõem o sistema e interagem diretamente com os seres humanos. Além disso, é a unidade territorial para implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos e atuação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (BRASIL, Lei nº 9.433, 8 de janeiro de 1997), sendo primordialmente adotada em estudos de planejamento ambiental.

O estudo da bacia hidrográfica, enquanto unidade espacial, traz à tona a trajetória científica por trás das formulações aqui expostas. O processo de desenvolvimento científico é responsável, ao longo da história do conhecimento humano, pela formulação de teorias que buscam compreender a realidade. Entre estas teorias, uma das mais aceitas no estudo de fenômenos físicos é a teoria dos sistemas.

Sistema é qualquer conjunto ordenado e inter-relacionado de coisas e seus atributos, conectado por fluxos de energia e matéria, distinto do ambiente circundante fora do sistema (CHRISTOPHERSON, 2012, p. 5).

A partir da teoria sistêmica, os sistemas naturais são considerados abertos devido às diferentes interações de suas partes. Muito presente na Geografia Física, esta corrente de pensamento é uma importante fundamentação nos estudos do meio ambiente a partir do conceito de geossistema, utilizado por autores como Sotchava (1978), Bertrand (2004), Tricart (1981) e Monteiro (2001).

A climatologia vale-se destas contribuições no estudo das diversas interconexões entre atmosfera e superfície terrestre, enquanto a bacia hidrográfica funciona como um elo de ligação necessário entre os fenômenos climáticos/meteorológicos e o escoamento superficial, sendo fundamental no estudo das precipitações atmosféricas.

Temos assim, para entender os fenômenos naturais do planeta, a importância de compreender os mecanismos atmosféricos e as trocas de energia com a superfície terrestre. As interações superfície-atmosfera revelam-se na bacia hidrográfica enquanto unidade de análise da paisagem. Para Monteiro (1974), a paisagem é um sistema dinâmico, aberto, definindo-a como

Entidade espacial delimitado segundo um nível de resolução do geógrafo (pesquisador) a partir dos objetivos centrais da análise, de qualquer modo sempre resultante da integração dinâmica, portanto instável, dos elementos de suporte e cobertura (físicos, biológicos e antrópicos) expressa em partes delimitáveis infinitamente mas individualizadas através das relações entre elas que organizam um todo complexo (Sistema), verdadeiro conjunto solidário e único, em perpétua evolução (MONTEIRO 2001, p. 39).

A análise da distribuição da precipitação pluviométrica da bacia hidrográfica do rio Tapajós entre os anos 2000 e 2017 possibilitará compreender a sua dinâmica hidrológica. Tal compreensão, à luz dos elementos geográficos e da ênfase climática, revelam sua importância por abordar questões relevantes para a sociedade no que diz respeito às mudanças ambientais e como se dá a apropriação das atividades humanas no espaço geográfico, permitindo uma visão integrada que pode subsidiar o gerenciamento desta unidade espacial.

Pretende-se, com a presente pesquisa, estudar a relação existente entre a superfície e a atmosfera terrestre no contexto do fenômeno climático da precipitação, analisando distribuição e variabilidade da precipitação pluviométrica na bacia hidrográfica do rio Tapajós em escala temporal e espacial, de forma a servir como uma tentativa de contribuição para a gestão hídrica da área.

1.1. Área de Estudo

A bacia hidrográfica do rio Tapajós localiza-se nas regiões Norte e Centro-oeste do Brasil, entre as latitudes 02º11’12,11’’ S – 14º55’14,72’’ S e longitudes 53º49’46,37’’ W – 60º07’06’’ W, compreendendo uma área de 492.263 km² (ANA, 2012, p. 29), que abrange parte dos estados do Pará, Amazonas, Mato Grosso e Rondônia (pequena área). Os principais afluentes do Tapajós são os rios Jamanxim, Crepori, Teles Pires e Juruena (Figura 1).


Figura 1
Localização da bacia hidrográfica do rio Tapajós.
Fontes:ANA (2013, 2019); IBGE (2015).

Apesar de sua expressividade e importância, não conta com um Comitê de Bacia Hidrográfica (CBH)[3] reconhecido no Sistema Nacional de Gestão dos Recursos Hídricos, de forma que representantes da comunidade possam discutir a respeito da gestão dos recursos hídricos conjuntamente com o poder público. Entretanto, algumas de suas sub-bacias estão representadas por comitês. São elas: CBH da Margem Esquerda do Baixo Teles Pires, CBH da Margem Direita do Alto Teles Pires e CBH dos Afluentes do Médio Teles Pires.

Sendo o Tapajós um dos principais afluentes do rio Amazonas, podemos considerar sua bacia, no que tange seu escoamento global, como uma bacia exorreica, devido ao escoamento das águas ocorrer de modo contínuo desde as sub-bacias até desembocarem diretamente no nível marinho no Oceano Atlântico. Já a configuração da drenagem, a partir do critério geométrico, apresenta predominantemente padrão dendrítico, com ramos formados pelos afluentes distribuindo-se em todas as direções sobre a superfície dos terrenos, formando ângulos agudos de graduações variadas (CHRISTOFOLETTI, 1980).

Para analisar a classificação climática da bacia hidrográfica utilizou-se o Mapa de Clima do Brasil (IBGE, 2002), que corrobora com a metodologia utilizada por Nimer (1989) para diferenciações climáticas, analisando o clima quanto aos domínios e subdomínios climáticos, as variedades climáticas e o tipo. Temos para a área de estudo a ocorrência predominante do clima tipo Equatorial, quente (com médias maiores que 18ºC em todos os meses do ano) e úmido, em áreas de 1 a 2 meses secos e outras com 3 meses. Há também, na região Sul da bacia, uma área significativa de clima Tropical Brasil Central, quente e semiúmido, com 4 a 5 meses secos (Figura 2).


Figura 2
Mapa de Clima da bacia hidrográfica do rio Tapajós.
Fontes: ANA (2013, 2019); IBGE (2002, 2015).

2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Realizou-se um levantamento inicial de séries históricas de precipitação pluviométrica disponibilizadas no Portal HidroWeb[4], ferramenta integrante do Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos – SNIRH, contendo informações coletadas pela Rede Hidrometeorológica Nacional – RHN, de responsabilidade da Agência Nacional de Águas – ANA. Os dados obtidos a partir da plataforma HidroWeb foram trabalhados em planilhas Excel, onde pôde-se organizá-los e realizar cálculos, proporcionando a confecção de tabelas, gráficos e sua posterior utilização em software de geoprocessamento (QGIS), insumos para a análise subsequente.

A confecção dos mapas de isoietas baseia-se em dados pluviométricos mensais, contemplando a área de estudo. Foram selecionadas 103 estações pluviométricas, das quais 49 localizam-se no interior da nossa área de estudo e 54 na área extra bacia, inseridas em um raio de 100 quilômetros do limite da bacia hidrográfica do rio Tapajós (Figura 3).


Figura 3
Distribuição espacial e abrangência dos postos pluviométricos selecionados.
Fontes: ANA (2013, 2019); HidroWeb (2019); IBGE (2015).

Na escolha dos postos observou-se, além da localização dos mesmos, a disponibilidade de dados e a série histórica de cada um. Buscando-se um período histórico representativo, aliado ao maior número possível de estações, estabeleceu-se uma série histórica de 18 anos, compreendidos entre janeiro/2000 e dezembro/2017.

O cálculo da área de abrangência foi feito a partir da estimativa da densidade mínima para análises climatológicas de postos pluviométricos da Organização Meteorológica Mundial (WMO), no qual regiões tropicais situadas no interior do continente devem contar com densidade mínima de 575 km². A partir desta área e valendo-se da fórmula abaixo, obteve-se o valor de 13,5 km de raio de abrangência de cada posto, resultando em uma abrangência aquém da estipulada pela WMO (1994, p. 259).

Visando a homogeneização dos dados, as falhas apresentadas pelos postos foram preenchidas pelo método da média aritmética, onde a falha é preenchida com a média daquele mês, obtida a partir dos outros anos daquela estação. Tal homogeneização de dados foi utilizada para a confecção dos mapas de isoietas de forma a espacializar os dados pluviométricos.

Além disso, para obtenção da precipitação média na área utilizou-se o método da média aritmética (BERTONI, TUCCI, 1993) visando a definição do período mais chuvoso e do menos chuvoso, além dos anos normal, seco e chuvoso com o cálculo do desvio-padrão, este sendo uma “medida do grau de dispersão dos valores em relação ao valor médio” (GALVANI, 2011, p. 474).

Para espacialização e análise dos dados fez-se necessária a utilização de Sistema de Informação Geográfica (SIG), permitindo o armazenamento e a visualização dos dados obtidos. Foi utilizado o software livre QGIS na versão 3.4.1 para elaboração dos mapas temáticos de caracterização da bacia e obtenção da hierarquia fluvial. Além disso, com a sistematização dos dados pluviométricos, utilizou-se do método de interpolação IDW (Inverso da Distância Ponderada, em inglês), que “atribui peso maior ao ponto mais próximo, diminuindo esse peso com o aumento da distância e em função do coeficiente potência” (RIGHI; BASSO, 2016, p. 104).

Para a representação espacial da precipitação pluviométrica adotou-se uma escala de cores em tons de azul com intervalos de 150 mm, determinado de forma a permitir a observação da variabilidade espacial das chuvas na área de estudo em um número de classes que apresentam distinção de tonalidade entre si.

Na análise da correlação entre o relevo e a distribuição espacial da precipitação, foram traçados dois perfis (A-A’ e B-B’) contemplando boa parte da área de estudo, de forma a obter nestes as médias pluviométricas e a altitude.

3. RESULTADOS

Calculando-se a média mensal de todos os postos pluviométricos selecionados podemos dividir os anos selecionados em período mais chuvoso, compreendendo os 6 meses do ano que apresentam as maiores médias pluviométricas – janeiro, fevereiro, março, abril, novembro e dezembro; e período menos chuvoso, que apresenta os menores totais pluviométricos – de maio a outubro (Figura 4).


Figura 4
Distribuição das precipitações médias mensais para a área de estudo no período de 2000 a 2017.
HidroWeb, 2019.

A partir do total anual de chuvas para a área de estudo (Figura 5) temos o panorama temporal da série histórica. A média da precipitação total anual na área de estudo foi de 2019,0 mm durante o período estudado, com desvio-padrão de 134 mm (linha preta presente em cada ano). Destaca-se os anos de 2002 e 2015 como menos chuvosos, apresentando totais pluviométricos abaixo de 1885 mm; além dos anos 2006, 2008 e 2013, anos mais chuvosos do período estudado, apresentando totais acima de 2153 mm.


Figura 5
Distribuição anual das precipitações médias para a área de estudo no período de 2000 a 2017.
Fonte:HidroWeb, 2019.

Pôde-se selecionar para análise da distribuição mensal das médias pluviométricas o ano com maiores médias: 2013 – ano chuvoso (Figura 6); com as menores médias: 2015 – ano mais seco (Figura 7); e o ano habitual: 2003 (Figura 8), cujo total pluviométrico é o mais próximo à média da série histórica, além de apresentar médias mensais semelhantes à distribuição mensal da série histórica.


Figura 6
Distribuição média mensal da precipitação em 2013 – ano chuvoso.
Fonte:HidroWeb, 2019.


Figura 7
Distribuição média mensal da precipitação em 2015 – ano mais seco.
Fonte:HidroWeb, 2019.


Figura 8
Distribuição média mensal da precipitação em 2003 – ano habitual.
Fonte:HidroWeb, 2019.

A distribuição espacial das chuvas na série histórica (Figura 9) revela uma maior concentração dos totais pluviométricos nos setores norte e central da bacia de estudo, sobretudo na região do Alto Tapajós. Já as menores médias são observadas ao sul da bacia, no Mato Grosso. Tal distribuição apresenta-se notadamente próxima à classificação climática do Mapa de Clima do Brasil (IBGE, 2002), apresentada anteriormente na caracterização da área de estudo (Figura 2).

Analisando-se as correlações já citadas entre a distribuição da precipitação na área de estudo com o relevo e explicitadas no mapa hipsométrico associado às isoietas (Figura 10) temos o perfil A-A’, de 1400 quilômetros de extensão, que contempla grande parte da área da bacia hidrográfica, desde o limite sudoeste, na Chapada dos Parecis, até o limite nordeste da bacia, na confluência dos rios Tapajós e Amazonas. Já o perfil B-B’, de 1000 quilômetros, retrata a região do Alto Tapajós à jusante da confluência dos rios Juruena e Teles Pires até o limite sudeste da bacia. Tal trajetória tenta contemplar parcialmente as áreas com os maiores e os menores índices pluviométricos da série histórica.

O perfil A-A’ (Figura 11), de altitude decrescente (660 metros no ponto A, até 4 metros no ponto A’), apresenta um acréscimo gradual de precipitação média, com variação da ordem de 500 milímetros. Aqui, evidencia-se a influência latitudinal nos totais pluviométricos que, em linhas gerais, apresenta-se inversamente proporcional à altitude do terreno.

Tal correlação entre altitude e precipitação também está presente no perfil B-B’ (Figura 12), de altitude crescente (158 metros no ponto B e 435 metros no ponto B’) e total de chuvas decrescente à medida que aproxima da borda sul da bacia. A região do Alto Tapajós, próxima ao ponto B, apresenta precipitação total de até 2500 milímetros em média no ano, enquanto que este valor atinge a faixa de 1600 milímetros no limite sudoeste da área de estudo.


Figura 9
Mapa da precipitação média anual da bacia do rio Tapajós no período estudado (2000-2017).
Fonte:ANA, 2013, 2019; HidroWeb, 2019; IBGE, 2015.


Figura 10
Mapa hipsométrico associado às isoietas e perfis traçados.
Fonte: ANA, 2013, 2019; IBGE, 2015, EMBRAPA, 2005; HidroWeb, 2019.


Figura 11
Precipitação média anual da série histórica e do relevo no perfil A-A'.
Fonte: HidroWeb, 2019.


Figura 12
Precipitação média anual da série histórica e do relevo no perfil B-B'.
Fonte: HidroWeb, 2019.

4. DISCUSSÕES E CONCLUSÕES

A partir da perspectiva sistêmica pôde-se desenvolver para a bacia do rio Tapajós um estudo da distribuição temporal e espacial da precipitação pluviométrica da bacia, correlacionando este fenômeno com os componentes do meio físico retratados na caracterização da bacia.

Dos anos estudados no período histórico houveram poucas variações dos totais pluviométricos anuais com relação à média da série histórica (2019,0 mm anuais), registrando apenas 3 anos com variação maior que o desvio-padrão do período (134) – 2002 (1842 mm), 2013 (2295 mm) e 2015 (1720 mm). O ano de 2002 apresentou um total de chuvas ligeiramente abaixo da faixa do desvio-padrão, enquanto que nos anos de 2013 e 2015 há uma maior diferenciação, da ordem de aproximadamente 150 mm em ambos. Não se pôde constatar, a partir dos valores anuais, alguma tendência de mudança nos totais anuais registrados na bacia de estudo.

Acerca dos períodos seco e úmido da série estudada mostrou-se, em todos os anos estudados, uma diferenciação muito clara entre eles, com médias pluviométricas mensais que apresentavam mudanças marcadas, como entre os meses de março e abril, que ultrapassou 100 mm. Tal dinâmica configura o Sistema de Monção da América do Sul (SMAS) e apresenta similaridades com o período estudado para a bacia hidrográfica do rio Tapajós.

A transição entre as estações úmida e seca é curta na Amazônia. O início da estação úmida em geral ocorre dentro do período de um único mês. A transição da estação úmida para a seca leva mais de um mês. O início da estação chuvosa na maior parte da Bacia Amazônica, estreitamente associado ao estabelecimento do Sistema de Monção da América do Sul, ocorre com rápida mudança da área de intensa convecção entre o extremo noroeste do continente e latitudes sul do equador, por volta de meados de outubro. O final do SMAS normalmente ocorre de abril a maio (NOBRE, 2009b, p. 153).

Quanto à distribuição espacial, há uma evidente diferenciação no sentido norte-sul da bacia, fruto de sua grande extensão e variação latitudinal. Por estar totalmente inserida no Domínio Equatorial, o clima é controlado, basicamente, “pela oscilação da ZCIT e pela ação dos alísios e baixas pressões equatoriais (doldrums)” (CONTI; FURLAN, 2014, p. 100). Diante de tais correlações, temos que o clima na área ocorre primordialmente em função da grande extensão latitudinal da área de estudo e dos diferentes subtipos climáticos, enquanto que o efeito orográfico não se apresenta como principal controle dos índices pluviométricos.

Além dos índices pluviométricos crescentes ao norte da bacia, devido à proximidade da ZCIT, uma área que apresentou grande destaque neste sentido foi a região do Alto Tapajós, na confluência dos rios Juruena e Teles Pires. Além da atuação da ZCIT deve-se citar, a partir de Nimer (1989, p. 376), a atuação da massa Equatorial continental (mEc). A expressiva pluviosidade desta região dá-se pela inserção nas áreas mais pluviosas da região amazônica devido à “sobreposição das chuvas de W da mEc e de N da ZCIT”.

Além da correlação com a mEc e a ZCIT há uma associação, de acordo com Limberger (2015), entre a variabilidade climática da região amazônica brasileira e a Temperatura da Superfície do Mar (TSM), estando a bacia hidrográfica do rio Tapajós, situada na região sul amazônica, sob influência do fenômeno El Niño-Oscilação Sul (ENOS)

4.1 Limitações da Pesquisa

A escassez de dados apresentou-se como uma “barreira” ao aprofundamento do estudo da precipitação na área de estudo. Em razão da sua extensão, há a necessidade de usufruir de um número elevado de postos pluviométricos para que se possa haver maior expansão de horizontes de pesquisa. Em razão da escassez de postos disponíveis, somada à média histórica limitada de muitas delas, obteve-se uma reduzida densidade de estações e um período histórico muito restrito, o que pode acarretar em distorções e má cobertura de grandes áreas, além de limitar a compreensão de possíveis tendências históricas. Soma-se a isso o número ínfimo de estações climatológicas disponíveis, restringindo o presente trabalho à precipitação pluviométrica.

A questão da falta de dados meteorológicos no Brasil é uma realidade, sobretudo em regiões de menor densidade populacional como a amazônica. Urge a necessidade de afirmar a importância de fomentar a produção e disponibilidade destes dados para todo o território, de forma que possamos compreender melhor nosso meio natural como forma de promoção do desenvolvimento do país por meio da educação e do conhecimento.

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YNOUE, R. et al. Meteorologia: noções básicas. São Paulo: Oficina de Textos, 2017.

Notas

[3] “Os Comitês de Bacia Hidrográfica, atores do Sistema Nacional de Gestão dos Recursos Hídricos, constituem o ‘Parlamento das Águas’, espaço em que representantes da comunidade de uma bacia hidrográfica discutem e deliberam a respeito da gestão dos recursos hídricos compartilhando responsabilidades de gestão com o poder público” (Agência Nacional de Águas – ANA. Comitês de Bacia Hidrográfica. https://www.ana.gov.br/aguas-no-brasil/sistema-de-gerenciamento-de-recursos-hidricos/comites-de-bacia-hidrografica. Acesso em 07/08/2019).
[4] (Agência Nacional de Águas – ANA. Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos – SNIRH. Portal HidroWeb: http://www.snirh.gov.br/hidroweb/publico/medicoes_historicas_abas.jsf. Acesso em 11/05/2019).

Autor notes

[1] Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas - Universidade de São Paulo.
[2] Professor Doutor do Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo-USP.


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