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Mulheres zapatistas: memórias e trajetórias do II encontro internacional de mulheres que lutam
Mujeres Zapatistas: recuerdos y trayectorias de el II encuentro internacional de mujeres que luchan
Zapatistas women: memories and trajectories of the II international meeting of women who fight
Revista Presença Geográfica, vol.. 07, núm. Esp.02, 2020
Fundação Universidade Federal de Rondônia

Artigos

Revista Presença Geográfica
Fundação Universidade Federal de Rondônia, Brasil
ISSN-e: 2446-6646
Periodicidade: Frecuencia continua
vol. 07, núm. Esp.02, 2020

Recepção: 27 Agosto 2020

Aprovação: 25 Setembro 2020

Resumo: O presente artigo busca reverberar as vozes das mulheres que lutam, sendo este um compromisso assumido enquanto participante do II Encontro Internacional de Mulheres que Lutam, no Caracol Morelia, Altamirano, Chiapas-México. Frente à necessidade de compartilhar com todas as mulheres que lutam, exprimem-se aqui todas as vivências, experiências, percepções e emoções sentidas pelo período de 26 a 29 de dezembro de 2019. Para conseguir captar a essência do que se mostra, utilizou-se como método o fenomenológico, com a abordagem empática de Edith Stein (1917), compreendendo as relações intersubjetivas estabelecidas entre o eu e a outra. Todavia, fez-se necessário utilizar ferramentas metodológicas como: diário de campo, registro fotográfico, depoimentos e entrevistas para estreitar as relações e compreensões. Percebe-se o quão significativo tornou-se o encontro em um processo de cura interior, por meio do compartilhamento de vivências subjetivas e que se tornaram experiências de cura e fortalecimento.

Palavras-chave: Mulheres Zapatistas, Feminismo Indígena, Lutas Feministas, Memórias e trajetórias.

Resumen: Este artículo busca resonar las voces de las mujeres que luchan, siendo este un compromiso asumido como participante del II Encuentro Internacional de Mujeres que Luchan, en Caracol Morelia, Altamirano, Chiapas-México. Ante la necesidad de compartir con todas las mujeres que luchan, se expresan todas las vivencias, experiencias, percepciones y emociones sentidas durante el período del 26 al 29 de diciembre de 2019. Para captar la esencia de lo mostrado, utilizamos como método fenomenológico, con el enfoque empático de Edith Stein (1917), que comprende las relaciones intersubjetivas que se establecen entre el yo y el otro. Sin embargo, fue necesario utilizar herramientas metodológicas como: diario de campo, registro fotográfico, testimonios y entrevistas para fortalecer relaciones y entendimientos. Está claro cuán significativo se ha vuelto el encuentro en un proceso de sanación interior, a través del intercambio de experiencias subjetivas que se han convertido en experiencias de sanación y fortalecimiento.

Palabras clave: Mujeres Zapatistas, Feminismo Indígena, Luchas Feministas, Recuerdos y trayectorias.

Abstract: This article seeks to reverberate the voices of women who fight, this being a commitment made as a participant in the II International Meeting of Women Who Fight, at Caracol Morélia, Altamirano, Chiapas-Mexico. In view of the need to share with all women who struggle, all the experiences, perceptions and emotions felt during the period from 26 to 29 December 2019 are expressed. In order to capture the essence of what is shown, we used as a phenomenological method, with the empathic approach of Edith Stein (1917), comprising the intersubjective relations established between the self and the other. However, it was necessary to use methodological tools such as: field diary, photographic record, testimonies and interviews to strengthen relationships and understandings. It is clear how significant the encounter has become in an inner healing process, through the sharing of subjective experiences that have become experiences of healing and strengthening.

Keywords: Zapatista women, Indigenous Feminism, Feminist struggles, Memories and trajectories.

INTRODUÇÃO

O presente artigo versa sobre o reavivamento das experiências vividas e compartilhadas pelas mulheres no II Encontro Internacional de Mulheres que Lutam, ocorrido no período de 26 a 29 de dezembro de 2019, no Caracol Morelia, município de Altamirano, Estado de Chiapas - México. Em atenção aos questionamentos sobre quais são os principais enfrentamentos das mulheres indígenas zapatistas e como suas lutas contribuem para o fortalecimento do feminismo, é que surge a necessidade de apresentar as vivências e experiências do encontro de mulheres que lutam.

Assim, o objetivo é o de compreender o universo feminista dentro do movimento zapatista, bem como a sua influência para as lutas feministas enfrentadas diariamente por diferentes mulheres em diversas localidades do país e do mundo, mas também fortalecer o movimento e atender o chamamento das mulheres zapatistas para as mulheres do mundo todo, comprometendo-nos em reverberar suas vozes, bem como prestar apoio para todas as mulheres que se encontram em situação de violência. Logo, emerge a necessidade de transcrever o vivido durante os quatro dias de encontro, e propagar aos interessados as ações desenvolvidas e a importância da união de forças.

Com o propósito de apresentar com maior fidelidade as experiências vividas pelas pesquisadoras e participantes durante o evento, trabalhou-se com o método fenomenológico, com abordagem empática de Edith Stein (1917), segundo o qual há a compreensão do outro a partir da compreensão de si, estreitando as relações intersubjetivas, isto é, com a uma possibilidade de compreender o outro pelo que se apresenta. A relação empática visualiza o outro e o compreende enquanto ser humano que é, formado pela mesma estrutura, que possui os mesmos atos da consciência. Assim, é possível compreender o outro, pois este é semelhante a mim.

Todavia, para ampliar o campo de discussão, foram utilizadas como ferramentas metodológicas como: diário de campo, conversas informais com as participantes do evento, registro de depoimentos, além do uso de registros fotográficos, apresentações de diversos tipos de artes, oficinas e pesquisa bibliográfica com autores, principalmente mexicanos, que versam sobre o Movimento Zapatista, além de registros históricos do EZLN disponível on-line.

Para compreender a importância das mulheres dentro do Movimento Zapatista e a necessidade que estas tiveram em criar o Encontro Internacional de Mulheres que Lutam, é preciso trazer à tona como foi criado o Exército Zapatista de Libertação Nacional – EZLN. No ano de 1983, de maneira clandestina, formou-se o EZLN, mas apenas em 1994 foi apresentado ao mundo por meio de uma ação armada, comandanda pela Major Ana María, que reivindicou a cidade de San Cristónal de las Casas e elucida a abordagem técnica do Exército Zapatista:

“Como somos muchos, nos organizamos por unidades y cada quien tiene su mando. Yo tengo a mi cargo una unidad grande que tiene muchos milicianos, más de mil. Esta unidad grande está dividida en unidades pequeñas, y cada una tiene su mando también. A cada uno de éstos mandos se les instruye, se le dice qué es lo que tienen que hacer, cómo atacar. Cada insurgente sabe como posesionarse y qué debe hacer, y los mandos estamos checándolos que cumplan con eso. Cuando atacamos San Cristóbal a unos les tocó poner los retenes y a otros las emboscadas en caso de que entrara el Ejército Federal; se reforzaron las entradas y salidas de San Cristóbal; a otros les tocó atacar la presidencia (municipal). A cada unidad le tocó cumplir una misión, así fue organizado. El mando coordina todo”. (CEDOZ, 1994)

Em entrevista[3] concedida para documentário sobre a Política no México, o subcomandante Marcos, o porta-voz do Movimento Zapatista, disse que os Zapatistas só se articularam diante das ações desenvolvidas pelas mulheres, que já não poderiam suportar mais perder seus filhos para a fome, tampouco não poder utilizar suas terras para a sua subsistência. Um pedido mais do que revolucionário, era um clamor por sobrevivência e a retomada de suas terras.

Desde a formação do EZLN, temos visto a importância das mulheres, mas qual a força que estas demandam para os demais movimentos que não estão diretamente ligados àqueles que estão entre as montanhas de Chiapas? Frente a esse questionamento é que o artigo apresenta uma contextualização histórica sobre a formação do EZLN e a participação das mulheres até o momento da partilha com as mulheres do mundo todo na busca por um outro mundo possível.

O Movimento Zapatista



No morirá la flor de la palabra. Podrá morir el rostro oculto de quien la nombra hoy, pero la palabra que vino desde el fondo de la historia y de la tierra ya no podrá ser arrancada por la soberbia del poder. Nosotros nacimos de la noche. En ella vivimos. Moriremos en ella. Pero la luz será mañana para los demás, para todos aquellos que hoy lloran la noche. Para quienes se niega el día. Para quienes es regalo la muerte. Para quienes está prohibida la vida. Para todos la luz. Para todos, todo. Para nosotros la alegre rebeldía. Para nosotros, nada. Nuestra lucha es por la vida y el mal gobierno oferta muerte como futuro. Nuestra lucha es por la justicia y el mal gobierno se llena de criminales y asesinos. Nuestra lucha es por la historia y el mal gobierno propone olvido. Nuestra lucha es por la paz y el mal gobierno anuncia muerte y destrucción. Para todos la luz. Para todos, todo. Para nosotros la alegre rebeldía. Para nosotros, nada. Aquí estamos. Somos la dignidad rebelde. El corazón olvidado de la patria.

Fonte: Subcomandante Marcos Ejército Zapatista de Liberación Nacional

O poema de abertura proferido pelo subcomandante Marcos, na primeira manifestação pública do Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN), é a expressão de todas as dores vividas pelos povos indígenas, descendentes do povo Maia e que resistem há mais de 500 anos. É a abertura das cortinas da invisibilidade e opressão, para o protagonismo do povo doravante denominado Zapatistas, que surge com a filosofia de “um outro mundo, por um outro caminho possível”.

O Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN), ou mais conhecido por Movimento Zapatista, foi inspirado na Revolução Mexicana liderada por Emiliano Zapata, que é considerado pelo povo mexicano como o maior líder revolucionário dos últimos tempos. Assim, a simbologia trazida pelo EZLN é marcada pela luta de terra e garantias de direitos aos povos originários do México, bem como contra a corrupção governamental, reforçando a luta iniciada por Zapata no início do século XX. Dessa forma, ao adicionar o nome zapatista, é um rememorar revolucionário, um envio de mensagem ao povo mexicano de que a luta não pode parar e de que é preciso manter viva a tradição revolucionária presente na subjetividade do povo mexicano.

A luta empreendida na contemporaneidade é similar à luta liderada por Zapata e isso corrobora que as ações do liberalismo nacional ainda permanecem fortemente articuladas no México, sendo necessária a organização de novos grupos para o enfrentamento e a garantia do direito à terra. Luta esta que não é diferente das demais ocorridas no Brasil e demais países da América Latina.

É importante enfatizar que a crise social vivida pelos povos descentes dos Maias em Chiapas tornou-se mais agravante a partir da proposta de reforma constitucional do artigo 27, juntamente com o Tratado de Libre Comércio da América do Norte (TLCAN), onde Carlos Salinas de Gortari, presidente mexicano (1988 - 1994), em 8 de novembro de 1991 anuncia e incentiva a reforma. No dia 1º de dezembro de mesmo ano, foi aprovada a reforma constitucional, o que polarizou o movimento campesino entre as organizações independentes que lutavam pelo investimento e produção nacional, a autossuficiência alimentar e a continuação da distribuição agrária, e organizações governamentais, principalmente a Confederação Camponesa Nacional (CNC), que apoiavam propostas de desenvolvimento e reforma ao artigo que promoveu o investimento estrangeiro, a produção exportada e a cessação da distribuição agrária. No dia 1º de janeiro de 1994 entra em vigor, o mesmo dia que se levanta em armas o EZLN. A escolha desta data pelos zapatistas demonstra a incoformação com a TLCAN.

A mudança constitucional promovia garantias aos detentores de poder, fazendo com que a população indígena e campesina não possuísse terra para sua subsistência e sobrevivência. Assim, as principais mudanças na lei orgânica foram: os posseiros receberam o direito legal de comprar, vender, alugar ou usar como garantia as parcelas individuais e as terras comuns que compõem a terra; as empresas privadas foram autorizadas a comprar terras de acordo com os limites legais associados a diferentes culturas; as reformas também permitiram novas parcerias entre investidores privados e posseiros; para garantir a propriedade privada, foram removidas as seções do artigo 27, que permitiam aos camponeses solicitar a distribuição da terra (HARVEY, 2000, p. 198).

No estágio neoliberal, idealizado por Carlos Salinas de Gortari, o capital é introduzido nas formas produtivas do camponês; diante da invasão, deformação e destruição, são criados movimentos de resistência luta pela terra. É sabido que em meados da década de 1970 decidiu-se modernizar o Estado de Chiapas, mas por qual motivo inicia-se o processo de liberalismo em Chiapas?

Em Chiapas, estão as maiores reservas de água potável do México, sobretudo na selva lacandona, como em montes Azules, onde rios caudalosos guardam o maior potencial para geração hídrica de energia elétrica. Também o subsolo chiapaneco é privilegiado. Lá estão as maiores reservas estratégicas de petróleo, gás natural e urânio do país. Acima da terra, uma grande diversidade florestal em madeiras nobres. Sem contar a biodiversidade de fauna e flora. Mas a maioria da população de Chiapas, indígena ou mestiça, padece das doenças mais primárias. Crianças morrem de diarréia, desidratação e outras enfermidades facilmente evitáveis com saneamento básico e comida. (ORTIZ, 2005, p. 177-178)

É no estado de Chiapas que se concentra a maior biodiversidade do México, desde as reservas de água até os mais requisitados minerais. Não podemos desconsiderar a ambição dos empresários no processo de exploração destes recursos naturais, juntamente com a exploração da mão-de-obra dos trabalhadores indígenas da região. Seria um grande negócio para o capital. Fora também em Chiapas os planos de construção de barragens hidrelétricas, a exploração de petróleo, a pecuária, sendo estas algumas das atividades econômicas iniciadas no Estado, mas enfatiza-se aqui a desapropriação de terras, bem como de formas tradicionais de reprodução dos camponeses e indígenas.

Diante do cenário posto pelos governantes mexicanos, os zapatistas se rebelaram na selva Lacandona, Los Altos e na região norte, onde a maioria da população é indígena (ESCÁRZAGA, 2017). Os camponeses indígenas das comunidades foram usados como mão-de-obra de trabalho para os grandes donos de terras, agricultores que exploravam com violência e contra os quais os zapatistas se rebelavam, pois para eles, o diálogo já não possível, uma vez que a legislação que lhes garantia terras para a subsistência já não existia, e, assim, Escárzaga acrescenta:

En la publicación de sus estatutos, en 1980, consideraban que la lucha pacífica se había agotado, siendo necesario enfrentar al poder mediante una guerra popular. Así se constituyeron como organización político-militar; su fin era que los trabajadores del campo y la ciudad de la República Mexicana tomaran el poder político, instaurando una república popular con un sistema socialista, derrotando al ejército, derrocando al gobierno, e instaurando un gobierno de transición y un nuevo Estado, el Estado proletário. (ESCÁRZAGA, 2017, p. 355-356).

Diante de uma ação arbitrária do governo e da não possibilidade de diálogo, o movimento Zapatista surge e foi publicamente conhecido no dia 1º de janeiro de 1994, quando o Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN) ante uma ação armada e estrategicamente organizada, comandanda pela Major Ana María, reivindicou, tomando para si a cidade de San Cristóbal de Las Casas e os povoados de Las Margaritas, Altamirano, Chanal, Ocosingo, Oxchuc, Huixtán, Chalan, Simojovel e San Andrés Larráinzar. O EZLN é uma organização político-militar, com ação social formada, principalmente, por indígenas dos povos Tzeltal, Tzotil, Chol, Tojolabal e Mam, pertencentes ao Estado de Chiapas.

Frente à aparição e à tomada da cidade, o EZLN teve a possibilidade de estabelecer um diálogo com os governantes mexicanos, a fim de apresentar suas demandas. Fora apresentada a declaração da Selva Lacandona, sendo esta a primeira declaração e que apresentava a busca pelo direito a terra, trabalho, moradia, alimentação, saúde, educação, independência, liberdade, democracia, justiça e paz. Reivindicações estas que são direitos garantidos a todos os mexicanos de acordo com a Constituição Federal de 1917, mas que não são cumpridas e existe a tratativa diferenciada em relação aos povos indígenas (ZOLLA, et. al., 2004).

De acordo com os estudos apresentados por Zolla et. al., 2004, e Miranda, 2016, tem-se que o EZLN já vinha se organizando desde a década de 1980 e há registros de que um pequeno grupo de guerrilheiros instalou-se na Selva de Lacandona já com a intencionalidade de criar uma frente de resistência armada no México, para garantir o direito à terra. Todavia, o grupo tomou força a partir da articulação entre indígenas, não-indígenas e pelo apoio de políticas organizacionais de esquerda, organizações não-governamentais de direitos humanos, pesquisadores universitários, intelectuais e organizações internacionais como a Organização das Nações Unidades (ONU), Organização dos Estados Americanos (OEA) e União Europeia (EU), mas sem negar a importância da estrutura organizacional indígena por meio de sua maneira autônoma de organização.

O EZLN é liderado pelo Comité Clandestino Revolucionário Indígena e suas bases militares são dirigidas por indígenas. A igreja católica também teve um papel importante na organização do EZLN. Esta ofertou apoio necessário no processo de formação política, assim como fora realizado no Brasil através das formações eclesiais de base. Além do apoio da igreja na formação política e de organização, contou-se também com o apoio dos campesinos, que possuem, assim como os indígenas, uma relação muito próxima com a terra. Evidencia-se aqui a importância das diversas relações com vários organismos. Estes foram primordiais para o crescimento do movimento zapatista.

Conforme elucidado, diversos atores se envolveram para apoiar a causa indígena em Chiapas, mas não se pode desconsiderar a origem dessa população. De acordo com Miranda, 2016, a frente de resistência da população de Chiapas sempre foi muito presente, sendo um povo conhecido por seu enfrentamento às diversas tentativas de colonização/exploração, e assim acrescenta:

No era la primera vez que la población indígena chiapaneca se rebelaba. Sus antepasados mayas destacaron entre los pueblos que más habían resistido la conquista: en Yucatán y Guatemala no fueron sometidos hasta 1703, y pronto volvieron a rebelarse. En Chiapas organizaron una gran revuelta en 1712, y estos mismos pueblos volvieron a rebelarse en enero de 1994. (MIRANDA, 2016, p. 2)

Diante da afirmativa da autora, compreende-se que a resistência é uma marca dos povos indígenas de Chiapas e entorno. Isso nos dá subsídios para compreender a razão de o governo mexicano tecer ações tão vorazes para impedir o fortalecimento do movimento zapatista, bem como as diversas tratativas de destruir sua identidade de povos originários; suas memórias; trajetórias; vivências, sempre com a intencionalidade de lhes privar e mudar o seu modo de vida e sua relação de força e resistência herdada de seus antepassados.

Enfatiza-se que o objetivo do Exército Zapatista de Libertação Nacional é uma luta contra as ações desenvolvidas pelo neoliberalismo e a busca da tomada do direito à terra pelos indígenas, que são os verdadeiros herdeiros destas terras há tanto tempo colonizada e explorada. Compreende-se que a busca pela emancipação indígena procura o reconhecimento da pluralidade das sociedades indígenas nas questões sociais, ambientais, políticas, culturais, econômicas, assim como o direito destas comunidades na tomada de decisão em sua forma de organização, pelo que representam, respeitando suas ancestralidades.

Ressalta-se que o peso das questões indígenas no discurso do EZLN ganha força e aliados, o que levou o Governo do México a um acordo político. A discussão entre os Zapatistas e o Governo visava selar a paz e estabelecer uma nova relação entre o Estado e os povos indígenas de todo o México (ZOLLA, et. al., 2004). Todavia as negociações não puderam ser concluídas uma vez que o governo mexicano não cumpriu com o acordado e lançou um ataque armado contra os zapatistas, solicitando a prisão dos líderes do movimento, estampando o rosto e toda a história de vida do líder zapatista, Comandante Marcos, assim como a perseguição contra todas as comunidades indígenas associadas aos zapatistas. O ataque foi considerado pela sociedade mexicana como um ato violento, cruel e covarde cometido pelo Exército Nacional a mando do Presidente Carlos Salinas e, mais acentuado, no governo de Ernesto Zedillo Ponce de Léon (1994 – 2000). A população civil mexicana iniciou mobilização com os dizeres: “Parem o genocídio em Chiapas”; “Não matem nossos irmãos”; “Clamamos por justiça”. E sempre realizando referências à luta liderada por Zapata e que a luta continua.

Zolla et. al. (2004), elucidam que as ações tomadas pelo governo tiveram que ser revertidas frente à mobilização da sociedade mexicana, que rechaçou todo o ato violento cometido contra o movimento zapatista, manifestando-se favorável a um diálogo de paz. Esta se desencadeou em marchas e mobilizações em todo o México. Para além, a imprensa internacional também ofertou forte pressão ao governo mexicano, prestando solidariedade aos povos indígenas articulados com o movimento zapatista. Assim, com uma nova possibilidade de diálogo, a luta do Exército Zapatista de Libertação Nacional torna-se mais engajada por meio do acesso a informações e diálogos com entidades não governamentais e há a possibilidade de a sociedade conhecer o outro lado da história, criando uma rede de solidariedade, em que se busca apresentar estratégias contra a implantação do neoliberalismo, bem como a corrupção dos governos.

De acordo com Miranda (2016), os zapatistas buscam garantir a integração social e política dos povos indígenas por meio de elementos fundamentais que se desenvolvem no reconhecimento e respeito de sua territorialidade, assim como a sua autonomia jurídica e política. Enfatiza-se também o direito de uso dos recursos naturais e territoriais; programas de desenvolvimento; políticas culturais próprias aos indígenas; educação indígena de qualidade; defesa da língua original (materna); gestão de seus meios de comunicação; proteção de suas formas de democracia (preserva-se a primazia do coletivo frente ao individual); a busca pelo consenso da autonomia municipal e mandar obedecendo – aqui os zapatistas mandam e o governo obedece. Estas são as ideologias basilares do movimento zapatista.

Mulheres Zapatistas



“Exigimos a todos los hombres del mundo que nos respeten… porque un México sin mujeres no sería México y un mundo sin mujeres tampoco sería mundo”.

Fonte: Mujeres Zapatistas


FIGURA 01
Insurgentes Zapatistas
Fonte: Dourado da Silva, Rachel. (2019). Chiapas-Méx.

Ao partir do pressuposto que o EZLN possibilita o respeito à terra, o coletivo frente ao individual, o reconhecimento das diversidades culturais entre os povos, dentro outros, tudo isso nos leva a questionar sobre a divisão de gênero dentro do movimento zapatista. Como são vistas e qual a possibilidade de fala destas mulheres? De acordo com entrevistas realizadas com guerrilheiras zapatistas no II Encontro Internacional de Mulheres que lutam, em dezembro de 2019, constata-se que é reconhecida dentro do movimento zapatista a importância da ação desenvolvida pelas mulheres, dentre as quais muitas estiveram à frente durante as ações armadas e são reconhecidas como símbolo de resistência não só para o movimento e para outras mulheres indígenas, mas o mundo (enfatiza-se aqui o movimento feminista) reconhece-as e valoram-nas. Por essa razão, Miranda (2016) grifa:

El zapatismo se diferencia de otros movimientos guerrilleros en la inclusión de demandas de género dentro de su plataforma de lucha a través de la Ley Revolucionaria de Mujeres. Esta ley fue el resultado de una consulta que varias mujeres zapatistas realizaron entre sus militantes y sus bases de apoyo y es conocida, según un comunicado del subcomandante Marcos, como “el primer levantamiento zapatista” (MIRANDA, 2016, p. 3)

O movimento Zapatista traz uma ideologia política pautada na valorização do ser humano e, diante da filosofia adotada, não poderia pensar em um movimento com a exclusão da maior parte da humanidade – as mulheres. Ao questionar como surge o Movimento Zapatista, elucida-se que foi movido a partir das mulheres, uma vez que estas estavam sempre questionando quando seria realizado algo para a valorização dos povos, o direito à terra; o cuidado e a proteção dos seus povos. A lei revolucionária de mulheres é um importante documento e traz os princípios basilares acatados para a luta, apoio e permanência das mulheres no movimento Zapatista. Assim, Marcos (2014, p. 01) enfatiza:

Sabemos que esta ley fue votada por consenso adentro de las filas del EZLN varios meses antes de su emergencia pública hace 20 años (1º de enero de 1994). Por una carta del Sub-comandante Marcos, sabemos que las reacciones fueron múltiples y que su aceptación tuvo que ser defendida con ahínco como uno de los objetivos centrales en su lucha por la justicia. Sabemos que la Comandanta Ramona y la Comandanta Susana, ambas, pasaron mas de 4 meses recorriendo las entonces comunidades zapatistas. Recorrieron todas y cada una y dialogaron con l@s zaptistas en colectivo, en asambleas comunitarias, a la usanza de los pueblos de la región. Una vez que fue aceptada en cada comunidad y pueblo zapatista se propuso su inclusión.

A autora Sylvia Marcos traz uma importante ação desempenhada pelas mulheres partícipes do Movimento Zapatista em organizar propostas de lei e, acima de tudo, percorrer todo o território para ouvir as propostas das companheiras que estão mais distantes e incorporar suas solicitudes na Lei Revolucionária de Mulheres. Faz-se presente o quanto o movimento feminista de mulheres zapatistas é integralista e que não existe a possibilidade de pensar um outro mundo se não ouvir e respeitar todas as mulheres do planeta, assim como fora elucidado pela Comandante Ramona em que um mundo não seria possível sem mulheres.

A Lei Revolucionária de Mulheres foi apresentada na primeira declaração de Lacandona e vem sendo garantido o seu cumprimento. O pedido pela justiça da igualdade de gênero, bem como a libertação do povo zapatista não poderia deixar de fora as questões femininas e que se expande não só para a mulher zapatista, mas também para a mulher mexicana e as mulheres do mundo todo, independente de raça, credo, cor, filiação política. A lei serve como requisito único para termos nossas vozes e nosso protagonismo respeitados e valorados enquanto sujeitas[4].

Por conseguinte, em respeito frente à situação de todas as mulheres, o EZLN incorpora em suas demandas de igualdade e justiça a Ley Revolucionaria de Mujeres, que segue:

1º Las mujeres, sin importar su raza, credo, color o filiación política, tienen derecho a participar en la lucha revolucionaria en el lugar y grado que su voluntad y capacidad determinen.

2º Las mujeres tienen derecho a trabajar y recibir un salario justo.

3º Las mujeres tienen derecho a decidir el número de hijos que pueden tener y cuidar.

4º Las mujeres tienen derecho a participar en los asuntos de la comunidad y tener cargo si son elegidas libre y democráticamente.

5º Las mujeres y sus hijos tienen derecho a ATENCION PRIMARIA en su salud y alimentación.

6º Las mujeres tienen derecho a la educación.

7º Las mujeres tienen derecho a elegir su pareja y a no ser obligadas por la fuerza a contraer matrimonio.

8º Ninguna mujer podrá ser golpeada o maltratada físicamente ni por familiares ni por extraños. Los delitos de intento de violación o violación serán castigados severamente.

9º Las mujeres podrán ocupar cargos de dirección en la organización y tener grados militares en las fuerzas armadas revolucionarias.

10º Las mujeres tendrán todos los derechos y obligaciones que señala las leyes y reglamentos revolucionarios. (Fonte: Enlance Zapatista[5])

Ao analisar os 10 (dez) artigos presentes na Lei Revolucionária de Mulheres, compreende-se que diversas questões referentes à autonomia do corpo; financeira; cultural; política; social e outras, estão diretamente presentes no que se considera necessário para garantia da dignidade humana e que as mulheres ainda estão distantes destes direitos, valendo-se da revolução para o seu reconhecimento. Assim, Dourado da Silva (2017) enfatiza que a partir da compreensão dos fatores necessários para o empoderamento e autonomia da mulher, percebe que há um tripé necessário para alcançá-los: autonomia do corpo (físico e psíquico e espiritual), autonomia financeira (econômica e política) e autonomia cognitiva (intelectual, social e cultural). Além disso, o alcance do empoderamento da mulher tem o objetivo de torná-la independente em sua vida, suas decisões, seus desejos, suas vontades, de poder participar de decisões em grupos sociais e em sua participação política, assim como prioriza o movimento zapatista.

As mulheres das comunidades indígenas zapatistas passaram pela desapropriação de suas terras, bem como de seus corpos. Desde a colonização, tem sofrido constantes rupturas e afastamentos de seus territórios, desde o simbólico e cultural, até o concreto que é a sua terra. Elas, junto com sua terra e sua cosmovisão, formam seu território e por ele tem lutado com a vida e pela vida. Tornar-se integrante das forças revolucionárias zapatistas é um mecanismo para defender essas terras, mas também recuperar seus corpos. Isso não significa apenas recuperar sua fonte de trabalho para viver. Essas mulheres recuperaram suas crenças, suas raízes, suas identidades, seus lugares sagrados, seus modos vida e por isso continuam a lutar, para que todas as mulheres possam ter suas vivências e experiências preservadas, com plena garantia de seus direitos fundamentais.

Ressalta-se que antes de ingressar na luta armada, as mulheres zapatistas viviam em condições de submissão, discriminação e violência de gênero. Não que já o tenham erradicado, mas conforme declaração proferida em dezembro de 2019, no II Encontro Internacional de Mulheres que Lutam, nenhum feminicídio foi registrado em território zapatista. As mulheres não decidiam sobre seus corpos ou suas vidas, não tinham direito à propriedade da terra, não participavam de nenhuma atividade comunitária, eram casadas à força, trocadas por gado ou bebidas alcoólicas. Parecia que sua única função era ter filhos, criá-los, cuidar dos maridos e fazer todas as tarefas domésticas.

As primeiras comandantes e insurgentes, ao compartilharem suas vivências, elucidaram que ao ingressar na luta armada significava abandonar suas famílias e não ter filhos. O treinamento nas montanhas do sudeste mexicano é forte e com poucas chances de casar, engravidar, muito menos criar alguém nas montanhas. Mas existia a possibilidade de aprender a ler, escrever, questionar e saber que outro mundo é possível, sendo este o principal motivo de tornar-se comandante e insurgente: a luta pelo próximo e pelo livre direito de escolhas.

A formação do EZLN, com todas as suas implicações, fez com que as mulheres se encontrassem, falassem e passassem a defender seus corpos e suas vidas. Como comunidade, os zapatistas estavam sofrendo dominação e exploração, mas o dobro foi acrescentado às mulheres, não só pela violência dos proprietários, mas também de seus maridos, pais e filhos, onde a síndrome do pequeno poder fazia-se presente e altamente ativa (SAFIOTTI, 1989). As mulheres promoveram fortemente a eliminação do consumo de álcool nas comunidades, bem como a redução da violência doméstica.

Nas palavras da Comandanta Ramona “Las mujeres llegaron a entender que es importante su participación para cambiar esta mala situación, así están participando aunque no todas directamente en la lucha armada. No hay otra forma de buscar justicia, ese es el interés de las mujeres” (CEDOZ, 1994). Os feitos logrados pelas mulheres zapatistas ocorrem diante da junção de formas, em que as diversas companheiras se tornam membros de uma comunidade e buscam de modo coletivo o bem comum, priorizando a erradicação de todas as formas de violência.

Em entrevista, a Major Ana María comenta que “desde el inicio del EZLN se celebra el 8 de marzo, se hace fiesta en las comunidades y los hombres se encargan de la comida, bromeando comenta que su sazón no es muy bueno” (CEDOZ, 1994). O reconhecimento do dia internacional das mulheres e sua escolha para os homens realizarem toda a organização e celebração, demonstram o respeito que o movimento zapatista possui por suas companheiras e que a busca por um mundo mais justo e igualitário para todas, todos e todxs é o que os move.

Encontro Internacional de Mulheres que lutam



“¡No nos dejen solas!” es el grito desesperado de las mujeres del Ejército Zapatista de Liberación Nacional para que su esperanza de ser escuchadas dentro y fuera de sus comunidades, no muera. “A todas les pedimos que luchen con nosotras”.

Fonte: Ana María Mayor de Infantería

O pedido de ajuda proferido pela Major Ana Maria em entrevista concedida por esta e pela Comandanta Ramona[6] nos apresenta a importância da luta coletiva, sem importar a raça, a cor, a posição política, a cultura, bem como questões sociais. O pedido é para que todas as mulheres ajudem a reverberarem suas vozes e suas lutas. A partir da solicitude das mulheres zapatistas, mulheres de diversos coletivos feministas iniciaram feitos que evidenciassem a luta empreendida pelas zapatistas, bem como a articulação de ações. No ano de 2007, durante Encontro de Mulheres Zapatistas, a Comandanta Ramona relata que as mulheres se encontraram com outras mulheres de outras partes do mundo e compartilharam suas experiências. As tratativas foram diversas, mas principalmente estudaram mecanismos de eliminar o consumo de álcool nas comunidades Zapatistas e, assim, obter a diminuição até a erradicação da violência doméstica contra as mulheres e crianças. Estavam presentes como lideranças zapatistas: a Major Ana Maria, Comandanta Ramona, Comandanta Ester e Comandanta Micaela.

A presença de outras mulheres e o compartilhamento de lutas proporciona o engradecimento de pautas e ações de enfrentamento para os diversos problemas enfrentados pelas mulheres e meninas. Por meio da consciência coletiva, surge a necessidade de criar um encontro nacional de mulheres que lutam. A luta não se apresenta apenas pelo fim da violência, mas todas as diversas formas de opressão que se vivencia por ser mulher e menina.

Diante da forte presença de mulheres e pautas distintas, pensou-se na importância da realização de um encontro internacional, realizado em terras zapatistas, sem a presença de homens, para que as mulheres do mundo todo pudessem se reunir livremente e falar abertamente sobre suas dores, suas raivas, suas estratégias e proporcionar a todas um processo de cura interior. Assim, em março de 2018, no Caracol Zapatista de La Zona de Tzotz Choj, em Chiapas – México, acontece o “Primer Encuentro Internacional, Político, Artístico, Deportivo y Cultural de Mujeres que Luchan”. A primeira frase de acolhida se dá em um chamamento para a luta e manifestação de todas as reivindicações necessárias para a garantia dos direitos e proteção da mulher e da criança. E assim enfatizam: “Acordamos vivir, y como para nosotras vivir es luchar, pues acordamos luchar cada quien según su modo, su lugar y su tiempo”.

Por muito tempo as ações feministas dentro de um coletivo misto ficaram em segundo plano, mas, dentro do movimento zapatista, as lutas precisam ser niveladas, pois não há a possibilidade de obtenção de direitos à terra, à segurança alimentar e outras, se o direito fundamental das mulheres não é garantido. Logo, a pauta principal dentro do movimento é a equidade de gênero. Para a articulação e presença massiva de mulheres do mundo todo, criou-se o encontro sem presença masculina, onde o sentimento de acolhimento e segurança deveria prevalecer durante o encontro.

A presença no encontro não erradica todas as problemáticas. Ao contrário, vem à tona diversas situações vividas por diferentes mulheres em diversos lugares do mundo, e o chamamento é para que não deixem de lutar e de reverberar as vozes de suas companheiras, independemente de suas localidades, crenças, raças, etc., pois uma chama foi acesa, a chama da luta pelos direitos da mulher: “Esa pequeña luz es para ti. Llévala hermana y compañera, llévala y, talvez, luego llegue en tu pensamiento que no habrá ni verdad, ni justicia, no libertad en el sistema capitalista patriarcal. Entonces talvez nos vamos a volver a ver para prenderle fuego al sistema”.

O primeiro encontro de mulheres que lutam trouxe esperança contou com participação de representantes dos cinco continentes, com um total de nove mil mulheres presentes. Ante a carta de agradecimento, ressalta-se a dificuldade na realização do evento, mas que tudo foi superado pela grandiosidade de estar juntas, como um coletivo de mulheres que lutam. Os ouvidos, os olhares, a comida preparada, o abraço, as oficinas ministradas, as diversas expressões de artes e muitas outras manifestações foram presentes dados umas para as outras, o que fortalece e engrandece o movimento.

Frente ao êxito obtido no primeiro encontro, iniciou a articulação do segundo encontro, cuja convocatória tem como tema: “A violência contra as mulheres”, com denúncias de vítimas de violências e em estabelecimento de estratégias de enfrentamento. Eis a convocação:

“Ahora se trata de que gritemos juntas, pero de rabia, de coraje, de indignación. Pero no cada quien por su lado, pedaceadas como nos violan y matan y desaparecen, sino que juntas, aunque cada quien en su tiempo, su lugar y su modo. Y de repente, compañera y hermana, qué tal que aprendemos no sólo a gritar de rabia, y también hallamos el modo, el lugar y el tiempo, para gritar un mundo nuevo.” (Convocatória II Encontro Internacional Mulheres que Lutam, 2019).

O chamamento é para a união de forças, com a possibilidade de tornar a luta das mulheres una, compreendendo que a dor da outra pode ser sentida pela companheira e juntas lutar por um mundo mais seguro. O pensamento zapatista é de que não podemos, por meio de nossas diferenças, tornarnos indiferentes. É através de nossas diferenças que surgem nossas forças e que se preservamos o respeito e a vontade de lutar juntas, isso nos faz companheiras. Frente a esta prerrogativa, surge o primeiro acordo das mulheres que lutam:

1º Que todas hagamos y conozcamos las propuestas según llegue en nuestro pensamiento sobre el tema de violencia contra las mujeres. O sea propuestas de cómo hacer para parar este grave problema que tenemos como mujeres que somos”.

2º Que si cualquier mujer en cualquier parte del mundo, de cualquier edad, de cualquier color pide ayuda porque es atacada con violencia, respondamos a su llamado y busquemos la forma de apoyarla, de protegerla y de defenderla.”

3º Que todos los grupos, colectivos y organizaciones de mujeres que luchan que quieran coordinarse para acciones conjuntas nos intercambiemos formas de comunicarnos entre nosotras, sea por teléfono o internet o como sea”. (II Encontro Internacional de Mulheres que Lutam, dezembro de 2019)

O acordo proposto no II Encontro se faz diante da necessidade de todas as mulheres presentes assumirem seus papéis durante o encontro e depois dele. O primeiro artigo se refere a abrir seus ouvidos, seus olhares, seu abraço, seu acolhimento para as demais companheiras, pois cada uma delas trazem consigo suas dores, suas coragens, como também suas indignações, suas angústias, vem trazendo de longe até as montanhas de Chiapas na esperança de terem seus fardos diminuídos com a partilha entre mulheres que lutam. E assim nos alertam: “Responder al llamado de la mujer que pida ayuda, apoyarla, protegerla e defenderla con lo que tengamos”.

Já o segundo artigo é uma reflexão do quantitativo de mulheres presentes e suas diversas localidades e nos dá como atividade buscar apoiar e reverberar suas vozes diante da opressão e da luta, sem questionar sua crença, cultura, posição política e outros. Por fim, o terceiro trata da importância de nos mantermos conectadas com os diversos coletivos existentes, por meio das tecnologias ou presencialmente, pois juntas somos mais fortes, mas jamais esquecer as companheiras que se encontram nas montanhas de Chiapas, bem como aquelas que ainda estão silenciadas, que não conseguiram sair de seus enclausuarementos.

Memórias e trajetórias do II Encontro Internacional de Mulheres que Lutam



“El micrófono abierto para compartir nuestras heridas nunca cerró, siempre hubo una compañera convirtiendo la rabia en palabras…”

Fonte: II Encuentro de Mujeres que Luchan


FIGURA 02
Mulheres zapatistas
Fonte: Dourado da Silva, Rachel. (2019). Chiapas-Méx.


FIGURA 03
Mulheres que Lutam
Fonte: Domínguez, Laura Gisela García. (2019). Chiapas-Méx.

A partilha não segue o rigor técnico científico e por vezes entraremos com nossas próprias emoções, a fim de apresentar ao leitor as perpecções sentidas através dos atos da consciência. A busca pela transmissão das vivências e experiências do vivido no II Encontro Internacional de Mulheres que Lutam se baseia nos depoimentos, nos registros fotográficos, nas cartas publicadas, na arte expressada, na comida compartilhada e em diversos outros momentos vividos durante o encontro. A intencionalidade de publicar estas experiências é a do compromisso assumido durante o encontro, principalmente no que se referem às ações por nós assumidas pós-evento.

Ao chegar à Cidade de San Cristóbal de Las Casas, uma cidade turística, cenário de revoluções, já era possível ver o quantitativo de mulheres tomando conta das ruas das cidades. A presença massiva já nos contagiava em visualizar direfentes rostos, ouvir diferentes vozes, diversas cores e todas com um só objetivo: lutar pelos direitos das mulheres. A cidade ganhou cara e objetivo diferente no dia 25 de dezembro de 2019, véspera do encontro. A busca por transportes que nos levassem ao Caracol iniciou cedo, e com muita comunhão de informações das companheiras, foi possível verificar transportes.

A duração da viagem foi de aproximadamente quadro horas, saindo das montanhas de San Cristóbal, para as montanhas de Altamirano, no Caracol Morélia. Percorrendo a estrada montanhosa, com uma paisagem exuberante, os pensamentos estavam envoltos no que viveríamos, no que compartilharíamos e como isso nos afetaria em nossas ações fora das montanhas.

Quando chegamos ao “pé da montanha”, tivemos que nos despedir dos nossos condutores, e iniciar nosso registro e ali seria o único lugar onde homens seriam permitidos. Dali em diante, as mulheres conduziam os caminhões, faziam a segurança, preparavam a comida, organizavam o evento e muitas outras atividades que são necessárias para a realização de um evento de grande magnitude. Com a simplicidade de uma faixa amarela, fomos recebidas como companheiras de luta.


FIGURA 04
Faixa de acolhimento ao II Encontro Internacional de Mulheres que Lutam
Fonte: Dourado da Silva, Rachel. (2019). Chiapas-Méx.

Este segundo encontro aconteceu pelo período de 26 a 29 de dezembro de 2019. A sua realização estava prevista para março de 2019, seguindo o mês da mulher, mas as companheiras zapatistas nos enviaram mensagem informando que não existiam condições de segurança a cumprir, a referir-se sobre os ataques paramilitares realizados. O contexto mexicano da época era a mudança presidencial, a saída de Enrique Peña Nieto (2012-2018) e a entrada de Andrés Manuel López Obrador (2018-2024) depois de duas fraudes eleitorais, o que significou um aglomerado de movimentos dentro da estrutura nacional. Ao mesmo tempo, o território foi disputado com o anúncio de López Obrador para a confirmação da realização do - batizado - “Trem Maya” e do projeto “Sembrando Vida”, que consiste na ampliação de monoculturas de frutas, a serem implantados em Chiapas.

Desta forma, com pesar, as companheiras zapatistas emitiram um comunicado nos convidando para o encontro que seria então realizado em dezembro de 2019, nas montanhas do sudeste mexicano, para continuar com o trabalho organizativo e de grande fortalecimento iniciado em março de 2018.

No dia 26 de dezembro estávamos em terras zapatistas, sendo recebidas por insurgentes, todas utilizando pasamontañas[7], cobrindo seus rostos, deixando apenas seus olhos luminosos a nos mirar. Com lenços vermelhos em torno do pescoço e uniformes verdes com tonfas, as insurgentes nos indicavam o caminho para as acomodações. O movimento das jovens, seu modo de conduzir, demonstrava disciplina e ao mesmo tempo gentileza.


FIGURA 05
Insurgentes organizadas para recepção das participantes
Fonte: Dourado da Silva, Rachel. (2019). Chiapas-Méx.

Na sexta-feira, dia 27 de dezembro, com o microfone aberto, nos deram as boas-vindas. De acordo com o registro, havia 3.259 mulheres, 95 crianças e 26 homens, sendo que estes ficaram aos “pés da montanha”. Um total de 49 países[8] dos cinco continentes se faziam presentes, pós-festividades, para denunciar, ouvir, respeitar e compartilhar vivências e experiências com as companheiras do mundo todo. A convocatória para o II Encontro Internacional de Mulheres que Lutam teve como tema: Violência contra a mulher. E foi dividido em duas partes, “uma de denúncia e outra do que vamos fazer para impedir esse massacre que estão fazendo contra nós”.

A proposta das companheiras zapatistas era um dia para chegar, um dia de acolhimento e microfone aberto para dizer ou gritar o que nos dói, um dia de reflexões e propostas para saber o que fazer, por que estão nos matando e mais um dia de atividades artísticas. O dia de compartilhar nossa dor durou até meia-noite, e a ferida se abriu durante o resto do encontro, o microfone aberto não fechou, sempre houve uma companheira que compartilhou sua raiva conosco.

Presenciamos que a força que o compartilhamento de histórias e o sentimento de ser acolhida acalmam toda a raiva, a inquietação, o sofrimento que estão dentro de nós. Ao partilhar a dor vivida e esta ser recebida pelas companheiras, estamos dividindo. Essa relação aproxima as diversas lutas diárias, mesmo não seguindo as mesmas ideologias, crenças, culturas, etc., mas a dor é universal e pode ser entendida e sentida por todas.


FIGURA 06
Momento de escuta de depoimentos
Fonte: Dourado da Silva, Rachel. (2019). Chiapas-Méx.

Presenciamos que falar da luta de mulheres é sempre uma inspiração para viver dias melhores. As diversas lutas, que aparentemente não se conectam, são um elo muito forte entre todas nós, principalmente quando nos reunimos. Esses momentos são de imersão empática que nos permitem conhecer e reconhecer a companheira a nossa frente e tornar sua experiência parte de nossa própria vivência.

Através dessa lógica empática, adentrar as montanhas do Caracol Morelia, e ouvir, compartilhar, viver junto com diversas mulheres, de tantos lugares, de tantas vivências, nos possibilita um experienciar de emoções que fortificam nossas lutas diárias, e reconhecer que todas as lutas, independentemente de ideologia, são importantes para a liberdade da mulher. A liberdade de permanecer viva.

As problemáticas vivenciadas por todas nós, sempre acabam tendo relação com a ideologia machista presentificada na ideia de que nossos corpos não nos pertence, e que por isso podem ser violados, desconsiderando a pessoa viva ali presente. Violar uma mulher é vê-la quebrar-se em diversas partes.

Por meio do encontro internacional de mulheres que lutam, a partilha dessas experiências é como um processo de cura, em que cada uma, a partir de sua experiência individual, cola em você um pedacinho dela e você se torna uma nova mulher, colada com cuidado e proteção por suas companheiras. Assim, a luta se dá em primeiro em juntar cada pedacinho destruído pelo machismo e reconstruir essa mulher que tinha morrido por dentro.

Depoimentos

Com a intencionalidade de agregar sentimentos de companheiras no que se refere ao Encontro de Mulheres que Lutam, apresentam-se aqui depoimentos de participantes, os quais elucidam suas principais impressões e emoções que se fizeram presentes durante o encontro. Em atenção à possibilidade de abertura dos sentimentos transferidos a estes depoimentos, não serão tecidos comentários frente ao exposto, para que a leitora/o leitor realize suas imersões e apreendem as subjetividades explicitadas por meio da intersubjetividade, do reconhecimento da pessoa que é semelhante a mim.

As figuras 7 e 8 demonstram um momento muito íntimo. Foi neste espaço coberto que muitas mulheres expuseram suas dores, algumas destas nunca tinham externado as violências que tinha vivido e ali se expuseram e se curaram. Muitas reconheceram a dor da outra, a sua dor, e se curaram. Outras sentiram a injustiça por ter que se calar, e ali falaram. O encontro foi um momento de cura para todas as mulheres do mundo, e estamos aqui hoje, para dizer: mulher, você não está sozinha!


FIGURA 07
Depoimentos e acolhimento de atos de violência contra a mulher
Fonte: Dourado da Silva, Suzanna. (2019). Chiapas-Méx.


FIGURA 08
Depoimentos e acolhimento de atos de violência contra a mulher
Fonte: Domínguez, Laura Gisela García. (2019) Chiapas-Méx.

Depoimento 1:

A mí algo que dijeron me calo bastante, fue al llegar y también cuando se clausuró y fue algo así como "cuánto dolor tienen que vinieron hasta estás montañas a decirlo" algo así, y la verdad para mí eso fue muy fuerte por qué es cierto

También dijeron así que yo recuerdo mucho que el encuentro si se hacía por las mujeres que ahí estábamos pero también por las que no habían podido ir. Eso para mí fue muy intenso porque llevaba la denuncia de una compañera que no pudo ir por qué estaba trabajando.

Yo fui al encuentro por qué lo necesitaba, no me lo imaginaba así como fue, la verdad estuvo bien chido me sentí muy protegida y cuidada por las zapatistas, me sentí tomada en cuenta como mujer.

De sí es la misma lucha yo creo que sí, yo siento que todas las que estábamos y las que no pudieron está necesitamos de nuestra dignidad como mujeres, de nuestro reconocimiento en el mundo, de ya no callar nuestro dolor, de no andar siempre pensando que por ser mujer una no es importante.

Y bueno yo lo que sentí estando allá no me lo creía, por 3 noches y 4 días me parece, sentí que habitaba en otra dimensión, en una donde me levantaba a las 6 am con gusto, donde me empezaba a dar sueño a las 8 pm cuando oscurecia, me sentía acompañada y segura.

Sentí mucha tristeza, rabia, impotencia, dolor, indignación, por todo lo que las mujeres denunciabamos en el micrófono.

Sentí muy feo, un manojo de enojos cuando vi a los hombres entrar en la noche al campamento. Sentí irá de mirarlos ahí tan curiosos e irrespetuosos de nuestra intimidad, sentí miedo de verlos y sentí odio hacia ellos.

Muy complicado todas las sensaciones del encuentro, pero ahora que lo escribo pasados ya casi 8 meses, les puedo decir que aún no termino de asimilar esta experiencia que me llevo hace unos meses a decir sí a aprender autodefensa y ha dejar a un ex que ya me atormentaba mucho.

Sentí alegría muchas veces también cuando comíamos juntas, tranquilas, cuando dábamos muchas vueltas en el mismo sitio y después de unas horas nos volvíamos a encontrar. Me gustó bañarme con el agua fresca, comer todo lo que nos prepararon las compañeras. Disfrute mucho cuando en el último día fueron las presentaciones artísticas, me encantó todo lo que las compañeras creativamente hacen para vender, fue ver mucha mucha belleza y talento.

Goce cantar con las compañeras en una noche.

Goce bailar danza africana, un día en la mañana.

Y bueno más o menos así fue mi experiencia.

Mariana Abad Jauregui. 31 años. Mexicana

Depoimento 2:

Nunca me habia sentido tan segura en mi vida, traje una linterna entre mis cosas para acampar y nunca lo tuve que usar, me di cuenta que las linternas las ocupo para caminar con seguridad en la noche... Estuve muy impresionada con la forma en que me llegó el mensaje sobre la autonomía y auto-organización... siento que fuimos varias durante los primeros días que no supimos exactamente qué hacer y cómo aporvechar, hasta que tomamos las riendas solas... y fue la metáfora perfecta para todo en la vida.

Delphine Tomes. 30 anos. Britânica.

Depoimento 3:

Más que reflexiones en esta parte quisiera compartir momentos que me provocaron sensaciones y percepciones nuevas en la vida. Las tres tienen que ver con la convivencia con los hombres. Sé que no todas las mujeres tenemos la misma postura, no todas nos llamamos feministas, pero de que estamos luchando, estamos luchando.

La primer noche tuve que dormir sola en una casa de campaña, lo primero que pasó por mi mente fue “¿y si me pasa algo?”, vi a mi alrededor y haciendo conciencia de que todas ahí éramos todas, que no había hombres, me provocó una sensación de seguridad imediata.

El primer día noté que estaba alerta, cuando caminaba, formada para pedir comida o simplemente contemplando la convivencia me inquietaba de pronto sentir que alguien se acercaba a mí, pensando que era un hombre ¡oh sorpresa! Cada que me pasaba eso tenía que hacer conciencia que no había hombres, con el transcurso de los días pude adaptarme y tener un proceso más de confianza. El encuentro me regaló saber que es convivir sin preocuparte porque te estén viendo lascivamente, queriendo entrar en contacto físico, acosándote.

Supe que después de la clausura ya iban a poder entrar los hombres, compañeros de las zapatistas, compañeros de las mujeres que se encontraban ahí, ellos se quedaron en un campamento mixto. La verdad, yo quería recordar y retener la sensación de seguridad que se había producido en ese espacio, sin embargo, tuve que mentalizarme para volver a la convivencia. Pasó que uno de los hombres que entraron, comió y no lavó su plato; tomando en cuenta que después de cuatro días y tres noches habíamos logrado tener cierto control en las tareas de cuidado, cada quien lavaba su plato, se hacía cargo de su basura orgánica e inorgánica, había más orden en las compras, en los baños, en la convivencia; todo este proceso no lo pudieron vivir los hombres y cuando entraron rompieron con esta dinámica, al día siguiente supe que hasta corretearon a esta persona para que lavara su plato. Otra situación fue cuando los compañeros de algunas de nosotras entraron a los dormitorios para poder pasar la noche con sus parejas, de nuevo, sin haber tenido la experiencia del encuentro y las compañeras queriendo reunirse con sus parejas, no nos tomaron en cuenta a las demás, de pronto había un hombre enfrente rompiendo con la intimidad que se había producido entre mujeres, sé que fue incomodo y un problema esa última noche.

Debo agradecer a todas las mujeres zapatistas que han trabajado décadas y por generaciones para que estos encuentros internacionales sean posibles. También sé que varias mujeres que comenzaron junto con el movimiento zapatista salieron porque dejaron de compartir los objetivos y estrategias del zapatismo. A esas mujeres también debo dar gracias porque fueron fundamentales al combinar la lucha armada con la lucha por la libertad de la mujer para decidir sobre nuestras vidas y nuestros cuerpos.

Laura Gisela García Domínguez. 32 años. Mexicana.

Depoimento 4:

Aprender a ser resistencia.

Para mí, poder ver de cerca la organización de las mujeres zapatistas fue un aprendizaje valiosísimo. Ellas nos ofrecieron un espacio seguro, libre de violencia y lleno de cuidados.

“Un mundo en el que quepan otros mundos” fue lo que yo vi, mujeres de distintos países, com diversas concepciones de la vida y de la lucha de mujeres nos concentramos en el território zapatista para escucharnos. Y en esa escucha yo me reconocía. Aprender a reconocernos em las otras, en sus dolores y en sus penas, sufrir sus historias, pero también reconocernos en sus luchas y alegrías, fue para mi una lección muy grande, aprender que a todas nos atraviesan distintas violencias y que todas tenemos historias qué contar y procesos que atravesar.

La lucha por la defensa de la vida se manifiesta de formas diferentes a lo largo y ancho del mundo, siempre los espacios de organización son primordiales, y los espacios de organización por y para mujeres son imprescindibles. La propuesta que yo vi, y que incluso sentí, fue la del cuidado de la vida siempre en el centro de la vida.

Aferrarnos al regalo que las compañeras nos dieron: sentirnos libres y seguras. Construir nuestras redes, nuestros espacios. Crear a partir de su ejemplo una nueva realidad para nosotras, replicarlo en cada uno de nuestros sitios.

Construir desde la escucha, el acompañamiento, el cuidado y la ternura. Es una forma de ser radical, es ver el problema en su raíz, es ver que nos han educado con pedagogías de la crueldad y rehusarnos a replicarlas. Es aprender que sí hay alternativas al sistema capitalista que tanto nos ha quitado, es defender nuestra vida y trazar nuestros propios caminos. Es sabernos vulnerables y aprender a trabajar colectivamente.

Y aprender también que los cambios no se dan de la noche a la mañana, que los câmbios requieren esfuerzo, ser constante, ser determinante, que son procesos largos. Pero esa es la lucha, mantenernos, ser la resistencia que las zapatistas nos han enseñado.

Creo que lo importante es eso, aprender que resistir no es sólo aguantar los incontables dolores que este sistema nos ha dejado, sino construir nuevas formas de vida.

Es transformar el dolor en rabia, en impulso.

Brenda Isabel Soto Vega. 22 años. Mexicana.

Depoimento 5:

Aquí van mis frases:

*El mayor compromiso que les pido es que vivan, vivan libres y seguras. Disfrutando pero alertas. (Aracely Osorio, mamá de Lesvy).

*La primera vez que la golpeó le dijo que el jugo de naranjas solo tenía dos claras de huevo, que seguramente ella se trago la tercera. Eso le ganó tremenda golpiza.

* Me tuve que convertir en defensora de los derechos humanos de niñas, jóvenes, de mujeres (Orines Buendía, mamá de Mariana Lima)

*Agradecer/agradecernos

*Rebeldes y libres. Deseamos vivir como queremos. En armonía con la tierra y con los que queremos. Ya nos sembraron la semilla de la envidia entre nosotras las mujeres ahora hay que quitarla de nuestra cabeza para que seamos más amorosas. (Mujeres chinantecas y magonistas)

*No debemos dejarnos atraer la propaganda de las empresas porque podemos seguir perdiendo nuestra identidad.

*Solo seremos libres cuando tengamos nuestra autonomía.

*Nombrar lo que podría arrebatarnos la vida.

*¿Por qué hemos sobrevivido a tanta violencia?

*Debemos conectar con nuestro cuerpo.

*No dejemos que todo esto solo se quede en este encuentro.

*No solo hay que organizamos también hay que fortalecernos. La una sin la otra se hace. Y siempre abrazar a la compañera después de dar su testimonio, no dejarla sola. (CONAVIGUA Guatemala)

*Las mujeres campesinas que cruzan de Juárez a Texas son dignas. Cruzan cada día el puente para ir a trabajar para que sus hijos tengan para comer y estudiar. Incluso hasta las mujeres de 72 años. Un trabajo que inicia de 3 am a 6 pm. (Roose Mary).

*Tocaron nuestro cuerpo pero no nuestra esencia.

-Todo lo que pueden hacer los niños lo pueden hacer las niñas. Todo lo que pueden hacer las niñas lo pueden hacer los niños. (Elizabeth Luciano).

*En las ciudades las comunidades están rotas, hay que rehacerlas.

*No soy de plástico pero si me creo súper poderosa cuando voy en mi bici.

Yssel Elisa Tarin Abrego. 36 años. Mexicana.

Depoimento 6:

Ao receber o convite para participar do II encontro internacional de Mulheres que Lutam, organizado pelas guerrilheiras Zapatistas, tive um misto de sentimentos muito intensos. O primeiro de curiosidade sobre essas mulheres que são símbolo de revolução armada, mas que não representam perigo para a sociedade civil. O segundo sentimento era o que poderia compartilhar com essas mulheres, o que minha trajetória no movimento feminista poderia contribuir com essa população que vive nas montanhas de Chiapas, utilizando-se da terra para sua sobrevivência e subsistência. Relembrei diversas teorias e como suas aplicabilidades possivelmente não fariam sentido... esse era o pensamento. Ao chegar em terras zapatistas fomos recebidos por um outdoor em plena montanha, com a frase: “Aquí manda el pueblo y el gobierno obedece”. A frase de impacto forte representa como está estruturada a organização dentro dos caracóis. Ao pensar na possibilidade de um outro mundo possível, me esperançou, por ali estar a ação prática deste mundo.

Tivemos um momento para efetivar as inscrições, sendo este um espaço misto e até o presente momento a presença masculina não incomodava. Ao terminar a inscrição, fomos direcionadas para um caminhão e na boleia, juntas com as demais companheiras, fomos cruzando as montanhas que nos separariam dos homens e que, ainda não imaginávamos, iria mudar toda a nossa história. Chegamos no acampamento destinado ao Encontro. Fomos recebidas por uma faixa de boas-vindas e guerrilheiras utilizando balaclave nos indicavam os caminhos, nos ajudavam a descer do caminhão e sorriam com os olhares, já que esta era a única parte do seu corpo que nos fora permitido conhecer. E uma parte muito nobre, com possibilidade de ver a esperança, a luta, a dor, o sofrimento, a alegria, tudo ali, tudo no olhar.

Ao escolher o lugar para dormir, não verificamos a questão de iluminação, se estava bem protegido, ou se tínhamos companheiras perto para nos acolher caso algo acontecesse. O sentimento de segurança era preponderante, mas não se dava conta disso. Acordávamos de madrugada e atravessávamos o acampamento para ir ao banheiro e não precisávamos de companhia, estávamos seguras. Esse sentimento de segurança permaneceu até o ultimo dia de encontro. Para além da segurança, tivemos a possibilidade de nos sentir livre, de usar as roupas que nos eram confortáveis, de nos arrumarmos como queríamos e de sentar livremente e conversar com as companheiras.

Para mim o momento mais difícil foram os depoimentos. Muitas histórias de mulheres destruídas e que buscavam ali o seu fortalecimento. No momento que iam narrando os fatos, as lágrimas escorriam, em todas as companheiras, e ao mesmo tempo surgia um sentimento de cuidado e proteção, com uma mão do lado que te segurava e dizia: não estás sozinha! Sim, foi o momento mais difícil, mas também o mais bonito. Foi o maior gesto de solidariedade que pude sentir.

O encontro não só trouxe a cura espiritual, mas trouxe companhia para a luta, trouxe esperança, trouxe gentileza, trouxe companheirismo e isso nunca tinha presencido. Sou grata pelas companheiras zapatistas e por todas as companheiras de luta que tive o prazer de conviver. Naquele momento vi que não importa a teoria, não importa e ideologia, não importa a crença, o que importa é a pessoa humana que se mostra frente a mim.

Suzanna Dourado da Silva. 36 anos. Brasileira.

CONSIDERAÇÕES FINAIS


FIGURA 09
Insurgentes Zapatistas em ação
Fonte: Veja, Brenda Isabel Soto. (2019) Chiapas-Méx.

Ao reavivar as memórias do que fora vivido no II Encontro Interncional de Mulheres que Lutam, bem como o de ler e reler os depoimentos das companheiras, que assim como nós, buscam um mundo mais justo e igualitário, onde nós, mulheres, possamos caminhar e viver livremente, sem nos preocuparmos se voltaremos para casa vivas por sermos mulheres, ou se sairemos de casa vivas, por sermos mulheres, nos traz esperança de dias melhores, da possibilidade de mudança a partir da força coletiva. Ser capaz de reconhecer e sentir a dor da outra e se manifestar, apoiando-a, é um mecanismo de fortalecimento enquanto mulheres.

Não temos como finalizar o presente artigo, pois este é uma recordação de dias vividos e que ainda estão sendo presentificados em nosso dia a dia, materializando-se em nossas ações em busca de um mundo com equidade de gênero. A possibilidade de registrar os depoimentos das companheiras é uma ação de respeito e consideração com suas vivências, sendo este um dos principais propósitos do artigo, em propagar novas concepções de lutas e enfrentamentos frente ao sistema machista e patriarcal.

As mulheres zapatistas são um exemplo de luta. Elas tiveram que se organizarem como guerrilheiras, mas também mostraram uma organização do espaço privado e compartilharam essa organização com as mulheres do mundo. Com elas, concordamos em viver e para elas viver é lutar e nos convidam a lutar cada uma segundo o seu modo, seu lugar e seu tempo.

Nossa mensagem é de que nunca devemos parar de lutar, e agora que a luz da revolução foi acesa, que esta se torne a chama do fogo revolucionário e que nunca deixemos de lutar por justiça, igualdade, respeito e liberdade das mulheres e das crianças! Avante companheiras, avante para a luta contra o patriarcado!

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Referências

CONVOCATÓRIA AO SEGUNDO ENCONTRO INTERNACIONAL DE MULHERES QUE LUTAM, Disponível em: http://enlacezapatista.ezln.org.mx/.

Notas

[3] Minissérie 1994, disponível em Netflix.com
[4] Utiliza-se o termo sujeitas para o feminino de sujeitos, garantindo a preservação da construção de um texto pautado na identidade de gênero.
[5] Disponível em: http://enlacezapatista.ezln.org.mx/
[6] No nos dejen solas': Entrevista con la comandanta Ramona y la Mayor Ana María. (1994)
[7] Balaclava: espécie de gorro feito de lã, utilizado para proteção do rosto em dias frios.
[8] Alemanha, Argélia, Argentina, Austrália, Áustria, Bangladesh, Bélgica, Bolívia, Brasil, Canadá, Catalunha, Chile, Colômbia, Costa Rica, Dinamarca, Equador, El Salvador, Espanha, Estados Unidos, Finlândia, França, Grécia, Guatemala, Honduras , Índia, Inglaterra, Irlanda, Itália, Japão, Curdistão, Macedônia, Noruega, Nova Zelândia, País Basco, Paraguai, Peru, Polônia, Porto Rico, Reino Unido, República Dominicana, Rússia, Sibéria, Sri Lanka, Suécia, Suíça, Turquia , Uruguai, Venezuela e México.

Autor notes

[1] Doutoranda do Programa de Pós-graduação em Geografia (PPGG) da Universidade Federal de Rondônia (UNIR). Pesquisadora do Grupo de Pesquisas em Geografa, Natureza e Territorialidades Humanas (GENTEH). Artigo elaborado para publicação com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.
[2] Mestranda em Geografia no Programa de Pós-graduação em Geografia da Faculdade de Filosofia e Letras da Universidad Nacional Autónoma do México – UNAM.


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