Revista Culturas & Fronteiras Volume 12 Nº 1- Outubro/2025
Grupo de Estudos Interdisciplinares das Fronteiras Amazônicas - GEIFA /UNIR
Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal de Rondônia
Disponível em: https://periodicos.unir.br/index.php/culturaefronteiras/index
EDUCAÇÃO CRÍTICA E PSICOLOGIA DA LIBERTAÇÃO:
Caminhos Para a Formação Docente e Transformação Social
PSICOLOGÍA CRÍTICA DE LA EDUCACIÓN Y LA LIBERACIÓN: Caminos hacia la
Formación Docente y la Transformación Social
Alessanda Alaine Rodrigues Moura 1
Indajara Gomes da Silva Magalhães 2
Vanessa Inuma Braga 3
Resumo
Este estudo visa analisar as contribuições das sistematizações de Martín-Baró e o papel
da escola na promoção de práticas formativas. O trabalho, de natureza bibliográfica,
qualitativa e usando a análise de conteúdo de Bardin (1977), adotando uma perspectiva
crítica com base nos debates conduzidos em sala de aula sob a mediação da Profa. Dra.
Solange Struwka, conforme abordado na disciplina de Psicologia da Libertação e
Psicologia Histórico-Cultural: possíveis aproximações a partir das particularidades do
capitalismo periférico, com o objetivo de interpretar as causas estruturais das injustiças
que afetam a saúde mental e o bem-estar dos indivíduos. O presente trabalho destaca a
importância da psicologia latino-americana e a obra de Ignácio Martín-Baró para
compreender as relações entre indivíduo e sociedade atrelado à educação. Ele critica a
psicologia tradicional por ser egocêntrica e individualista, ignorando as dimensões sociais
e culturais. A proposta é construir uma psicologia que reflita a realidade da América Latina
e que promova a transformação social. Nesse cenário, a educação é vista como uma
ferramenta crucial, com a escola desempenhando um papel fundamental na construção de
uma sociedade mais justa e igualitária. A Psicologia da Libertação e a análise decolonial
são abordagens que valorizam a diversidade e os conhecimentos locais, buscando a
emancipação dos indivíduos. Adicionalmente, o estudo observa que as obras de Paulo
Freire defendem a importância da prática pedagógica, da conscientização e da ação
coletiva como meios para transformar a sociedade
Palavras-chave: Psicologia latino-americana; Martín-Baró; Paulo Freire; Educação;
Transformação social.
1 Mestranda do Programa de Pós-Graduação Mestrado Acadêmico em Psicologia PPGPSI, na Universidade Federal
de Rondônia-UNIR. http://lattes.cnpq.br/4434082759919827 E-mail: Alaynepedagoga@gmail.com.
2 Mestranda do Programa de Pós-Graduação Mestrado Acadêmico em Psicologia PPGPSI, na Universidade Federal
de Rondônia-UNIR. http://lattes.cnpq.br/2348405896296208 E-mail: indajaragomes@gmail.com
3 Mestranda do Programa de Pós-Graduação Mestrado Acadêmico em Psicologia PPGPSI, na Universidade Federal
de Rondônia-UNIR. http://lattes.cnpq.br/2480401274019563 E-mail:Vanessainuma.ibl@gmail.com
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Resumen
Este estudio tiene como objetivo analizar las contribuciones de las sistematizaciones de
Martín-Baró y el papel de la escuela en la promoción de prácticas formativas. El trabajo, de
carácter bibliográfico y cualitativo, utiliza el análisis de contenido de Bardin (1977) y adopta
una perspectiva crítica basada en los debates desarrollados en el aula bajo la mediación de
la Prof. Dra. Solange Struwka, según lo abordado en la asignatura Psicología de la
Liberación y Psicología Histórico-Cultural: posibles aproximaciones a partir de las
particularidades del capitalismo periférico, con el propósito de interpretar las causas
estructurales de las injusticias que afectan la salud mental y el bienestar de los individuos.El
presente estudio destaca la importancia de la psicología latinoamericana y la obra de
Ignacio Martín-Baró para comprender las relaciones entre individuo y sociedad vinculadas
a la educación. Critica la psicología tradicional por ser egocéntrica e individualista,
ignorando las dimensiones sociales y culturales. La propuesta es construir una psicología
que refleje la realidad de América Latina y promueva la transformación social.En este
contexto, la educación se concibe como una herramienta fundamental, y la escuela
desempeña un papel esencial en la construcción de una sociedad más justa e igualitaria.
La Psicología de la Liberación y el enfoque decolonial son perspectivas que valoran la
diversidad y los saberes locales, buscando la emancipación de los individuos. Además, el
estudio observa que las obras de Paulo Freire defienden la importancia de la práctica
pedagógica, la concientización y la acción colectiva como medios para transformar la
sociedad.
Palabras clave: Psicología latinoamericana; Martín-Baró; Paulo Freire; Educación;
Transformación social.
INTRODUÇÃO
Este estudo tem origem nas discussões desenvolvidas em sala de aula na disciplina
de Psicologia da Libertação e Psicologia Histórico-Cultural do mestrado acadêmico em
Psicologia da Universidade Federal de Rondônia - UNIR. Nessas discussões, foram
abordadas concepções implementadas por autores como Ignácio Martín-Baró (1942-
1989), Lev Vygotsky (1896-1934) e JoCarlos Mariátegui (1894- 1930), entre outros, que
buscam explicar as tarefas da psicologia em diversos aspectos da existência humana. Um
dos grandes eixos de debate girou em torno da Psicologia da Libertação, cujas diretrizes,
fortemente baseadas nas concepções de
Martín-Baró, destacam a importância de considerar o contexto social e histórico na
prática psicológica e educacional.
Para compreender os fenômenos sociais e históricos e avançar na construção de
uma sociedade mais justa e igualitária, várias teorias oferecem explicações e contribuições
valiosas. Este estudo adota a Psicologia da Libertação, conforme defendida por Martín-
Baró, por possibilitar uma ampliação das articulações entre instituições, formação e
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trabalho. Essa abordagem promove práticas que criam espaços de troca e interação, onde
a ação do psicólogo pode ocorrer de forma mais assertiva, gerando benefícios
significativos para a educação.
A Psicologia da Libertação enriquece a compreensão das dinâmicas sociais,
econômicas e culturais, contribuindo para a melhoria das práticas pedagógicas,
especialmente no desenvolvimento do psiquismo humano, tanto do professor quanto do
aluno. Martín-Baró (1984) argumenta que essa abordagem possibilita a criação de
ambientes educacionais que não apenas respondem às demandas culturais e sociais
específicas, mas também promovem uma transformação social mais ampla e
emancipatória.
Nesse contexto, a emancipação é entendida como um processo de libertação crítica
e reflexiva, que visa promover a autonomia intelectual e social dos indivíduos, desafiando
estruturas de opressão e fomentando uma consciência crítica que possibilita mudanças
significativas nas relações sociais e nas estruturas de poder. Essa forma de educação
busca provocar uma inflexão no educando, promovendo sua autoconscientização e o
fortalecimento do ego.
Dessa maneira, a educação deve ser compreendida como uma forma de
intervenção no mundo, funcionando como uma prática social humanizadora. Seu objetivo
não é apenas transmitir conteúdos historicamente produzidos pela humanidade, mas
também colaborar na desmistificação desses conteúdos, contribuindo para a formação de
sujeitos críticos e conscientes da realidade em que estão inseridos.
METODOLOGIA
A presente pesquisa adota a metodologia de análise de conteúdo proposta por
Bardin (1977). De acordo com o autor, a análise de conteúdo é definida como um conjunto
de técnicas de análise das comunicações, que utiliza procedimentos sistemáticos e
objetivos de descrição do conteúdo das mensagens. O objetivo é inferir conhecimentos
relativos às condições de produção e recepção dessas mensagens.
A análise de conteúdo é uma técnica amplamente utilizada em pesquisas
qualitativas, especialmente na área da educação, por sua capacidade de revelar
significados implícitos nos textos e discurso. Nesta pesquisa a técnica foi utilizada com o
objetivo de investigar a Educação Crítica e a Pedagogia da Libertação. Através dessa
metodologia, foi possível identificar e interpretar os significados subjacentes nos discursos
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educacionais, proporcionando uma compreensão mais profunda dos fenômenos
estudados.
O conteúdo bibliográfico desta pesquisa está fundamentado na obra de Ignacio
Martín-Baró, que oferece uma perspectiva crítica sobre o papel da escola na sociedade.
Parte da pesquisa parte de uma análise qualitativa obtida durante as aulas de Psicologia
da Libertação e Psicologia Histórico-Cultural, sendo, pois, fundamental na elaboração de
ideias e conceitos importantes, dos quais foram realizados observações e registros em
sala. Outras obras, como as de Paulo Freire e Vygotsky foram fundamentais para a
formação do pensamento textual, as quais foram de grande relevância para a conclusão
da pesquisa.
REFERENCIAL TEÓRICO
A obra de Ignácio Martín-Baró é um marco fundamental para a psicologia
latinoamericana, especialmente ao analisar a consciência humana em seu contexto social.
Martín Bademonstra que os sofrimentos psicológicos não são fenômenos isolados, mas
sim o resultado de vidas marcadas por desigualdades e injustiças. (DIAS, 2020).
A compreensão crítica da psicologia latino-americana exige reconhecer suas
raízes históricas,profundamente vinculadas ao passado colonial e à dependência. Por
muito tempo, a psicologia na região foi utilizada como instrumento de dominação,
legitimando estruturas de poder ao apresentar a modernidade tecnológica como solução
para todos os problemas sociais. (DIAS, 2020). Segundo Martín-Baró (2011), a psicologia
latino-americana, ao importar modelos teóricos eurocêntricos como o positivismo e o
individualismo, acabou se distanciando das realidades sociais e culturais da América
Latina.
Essa visão fragmentada serviu aos interesses capitalistas ao promover valores
como o consumo, a competição e a busca individual pelo prazer. A precariedade dessa
psicologia está ligada a uma ideologia de adaptação ao sistema existente, que impede uma
análise crítica das relações de poder e das desigualdades sociais. Para superar essa
limitação, é necessário resgatar a dimensão da consciência e construir uma psicologia que
estabeleça uma relação dialética e histórica entre conhecimento e ação, buscando a
transformação social. (PEREIRA, 2019).
Nesse sentido, a escola deve ser concebida como um espaço institucional que
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promove a construção de uma sociedade mais justa e igualitária por meio da educação.
Para isso, é essencial implementar currículos inclusivos, formar continuamente os
docentes, promover a participação ativa dos alunos e adotar políticas antidiscriminação. A
educação deve ir além da simples transmissão de conhecimento, valorizando a
diversidade, criticando as desigualdades e empoderando os indivíduos para que possam
transformar suas vidas e a sociedade. (PEREIRA, 2019).
Ainda, é necessário compreender como os marcadores sociais de raça, gênero,
classe e idade influenciam as experiências e oportunidades das pessoas. É fundamental
perceber como a herança colonial ainda permeia a educação brasileira, impondo a cultura
e o conhecimento europeus como padrões dominantes. Esse processo deslegitimou as
diversas formas de saber dos povos originários e de outros grupos marginalizados. A
escola, nesse contexto, desempenhou um papel como instrumento de dominação cultural,
contribuindo para a destruição de identidades e o silenciamento de vozes. (LEITE;
RAMALHO; CARVALHO, 2019).
A ação educativa deve ser vista como instrumental, utilizando signos como
mediadores para provocar mudanças significativas no comportamento humano. Entre o
indivíduo e o ambiente, o signo cultural atua como um estímulo de segunda ordem,
transformando manifestações espontâneas em ações volitivas. Esse processo permite que
o psiquismo atinja um funcionamento de qualidade superior, desvinculando-se de
determinismos biológicos e do contexto imediato. (VYGOTSKY, 1997).
A Psicologia da Libertação emerge como um pilar fundamental para a construção
de sociedades mais justas e equitativas, valorizando a diversidade cultural e promovendo
a emancipação dos indivíduos. Essa perspectiva se contrapõe àpsicologia tradicional,
que perpetua as desigualdades ao ignorar os contextos históricos e sociais. Em vez de
apenas tratar os sintomas do sofrimento individual, a Psicologia da Libertação busca
transformar as condições sociais que geram esse sofrimento.
Martín-Baró argumenta que a psicologia deve ser um instrumento de libertação,
contribuindo para a construção de uma sociedade mais justa e humana (MARTÍN- BARÓ,
2017). Nesse contexto, a educação é uma ferramenta poderosa, oferecendo um espaço
privilegiado para o desenvolvimento de uma consciência crítica e para a valorização das
identidades locais.
De acordo com Paulo Freire, a educação deve ser um ato de libertação, permitindo
que o educando se torne sujeito de sua própria história. Freire propõe uma educação
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problematizadora, que capacite os indivíduos a questionar a realidade opressiva em que
vivem e a atuar de maneira transformadora sobre ela (FREIRE, 2004). Essa perspectiva
está alinhada com a análise decolonial, que critica as estruturas coloniais de poder e
conhecimento, propondo uma reorientação epistemológica que valorize os saberes e
práticas dos povos colonizados.
Ao desconstruir hierarquias coloniais e eurocêntricas, a análise decolonial revela
como a educação tem sido utilizada como ferramenta de dominação cultural. Ao
desconsiderar as realidades e necessidades das comunidades locais, a educação
tradicional perpetua uma colonização epistemológica. A análise decolonial propõe uma
educação que valorize a diversidade cultural e os conhecimentos locais, permitindo que
os indivíduos se libertem das imposições coloniais e construam uma identidade crítica e
autônoma. Dessa forma, a educação se torna um espaço de resistência e transformação
social.
Assim, quando aliada à Psicologia da Libertação e à análise decolonial, a
educação torna-se um instrumento de transformação e emancipação (SENA; SILVA,
2004). Ela promove o reconhecimento e a valorização das histórias, saberes e lutas dos
povos marginalizados, oferecendo uma alternativa ao modelo educacional hegemônico
que muitas vezes perpetua a opressão.
Nesse sentido, é essencial adotar uma educação problematizadora, onde os
oprimidos compreendam que as teorias possuem premissas e que o referencial teórico
orienta a prática. Esse entendimento é fundamental para reconhecer o papel da psicologia
na transformação social. Uma prática teórica que promova a emancipação dos indivíduos
é crucial para a construção de uma sociedade mais justa e equitativa(VYGOTSKY,
2003).Portanto, as visões teóricas de Martín-Baró e Paulo Freire abrem caminho para a
criação de uma nova ordem social, centrada na igualdade e na justiça social. Essas
abordagens complementares enriquecem a compreensão das relações entre opressor e
oprimido, destacando a importância da análise crítica e contextualizada das dinâmicas de
poder. Ambas sublinham a necessidade de conscientização, ação coletiva e
transformação social como fundamentos essenciais para a libertação dos oprimidos.
Ao integrar essas práticas pedagógicas com uma análise crítica da historicidade e
da subjetividade dos sujeitos, sob a ótica da psicologia histórico-cultural, é possível
compreender como fatores sociais, históricos, econômicos e políticos influenciam tanto o
ambiente escolar quanto a formação dos profissionais que nele atuam (BARROCO;
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ZIBETTI; FACCI, 2021). Dessa forma, os educadores assumem o papel ativo de agentes
sociais capazes de provocar mudanças significativas no meio em que atuam (BRINO &
SOUZA, 2016).
Formação Docente na Amazônia
Ao adentrarmos nas perspectivas da formação docente, observa-se que o
currículo de formação segue a premissa de uniformização do sistema educacional. No
entanto, surge a questão: como educar em um país tão plural, repleto de diversidade
cultural, linguística e étnica? Na organização curricular do curso de Pedagogia, conforme
estipulado, devem ser observados os princípios constitucionais e legais; a diversidade
social, étnico-racial e regional do país; a organização federativa do Estado brasileiro; a
pluralidade de ideias e concepções pedagógicas; e o conjunto de competências dos
estabelecimentos de ensino e dos docentes, conforme previsto nos arts. 12 e 13 da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/1996), além do princípio da gestão
democrática e da autonomia. (BRASIL, 2005, p.10).
Entretanto, na prática, esses princípios curriculares muitas vezes se perdem, tanto
no processo de formação docente quanto na atuação profissional. Um exemplo claro dessa
desconexão é a adoção do livro didático padronizado, que, uma vez produzido e aprovado,
é distribuído de maneira uniforme para toda a rede pública em praticamente todo o território
nacional. Esse material, ao ignorar as particularidades regionais, muitas vezes utiliza
imagens e representações culturais inadequadas ou distorcidas, desconectadas das
realidades vividas pelas populações representadas.Quando esse instrumento é utilizado
como norteador da prática docente, ele acaba o considerando os saberes locais e as
experiências dos alunos, que são submetidos a um conteúdo que pouco dialoga com suas
vivências. Vygotsky (1984) defende que a aprendizagem deve ser significativa e partir dos
conhecimentos prévios do sujeito, entendendo que cada aluno traz consigo um repertório
de experiências sociais que influenciam seu desenvolvimento. O aluno deve ser o
protagonista de sua aprendizagem, participando ativamente das atividades e construindo
seus próprios conhecimentos. A mediação do docente deve considerar o contexto no qual
o aluno está inserido, respeitando suas formas de expressão e manifestação do
conhecimento.
Quando falamos da formação docente na Amazônia, os desafios se tornam ainda
mais evidentes. A vasta extensão territorial, a diversidade cultural e socioambiental, o
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acesso limitado a recursos e infraestrutura, e as demandas específicas das comunidades
locais exigem abordagens inovadoras e contextualizadas. A Região Norte do Brasil abriga
uma rica diversidade de povos indígenas, comunidades ribeirinhas e quilombolas, cada
qual com suas línguas, culturas e modos de vida. A formação docente precisa ser sensível
a essa diversidade, preparando os professores para o diálogo intercultural e o respeito às
diferenças.
Além disso, a complexidade dos ecossistemas amazônicos exige a incorporação
de conhecimentos sobre biodiversidade e sustentabilidade na formação dos professores,
promovendo uma educação que além da simples transmissão de conteúdo. Para que o
docente consiga mediar esse diálogo cultural e prover um espaço de libertação para a
manifestação dos sujeitos, sua formação precisa ser ajustada às realidades regionais e
culturais em que atuará. Isso implica preparar os professores para lidar com a dualidade
entre conteúdos universais e as singularidades de cada aluno.
Desse modo, a formação docente deve capacitar os educadores para
compreenderem que, embora determinados assuntos possam ser unânimes, cada sujeito
é único. O desafio é criar práticas pedagógicas que proporcionem o desenvolvimento pleno
do ser, considerando os aspectos psicoeducacionais que influenciam o processo de
ensino-aprendizagem. O currículo precisa ser flexível e adaptável, capaz de dialogar com
as diferentes realidades culturais do país e de promover uma educação emancipadora e
crítica, que valorize os saberes locais e respeite a diversidade dos alunos.Por fim, é
crucial reconhecer que a educação deve ser uma prática social transformadora, capaz
de promover o desenvolvimento humano em todas as suas dimensões. Isso requer a
adoção de currículos que considerem a pluralidade de ideias e culturas, e a formação de
professores preparados para mediar o diálogo entre o conhecimento universal e as
realidades locais. Ao fazer isso, estaremos contribuindo para a construção de uma
sociedade mais justa, equitativa e inclusiva.
CONCLUSÕES
A educação, analisada sob a perspectiva da Psicologia da Libertação e da análise
decolonial, emerge como um instrumento poderoso para a transformação social e a
emancipação humana. Ao contrário da psicologia tradicional, que muitas vezes
desconsidera os contextos históricos e sociais dos indivíduos e acaba perpetuando
desigualdades, essas abordagens críticas nos mostram que a verdadeira mudança requer
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uma educação que vá além da transmissão de conteúdos e se conecte profundamente às
realidades vividas pelos educandos. Tanto Martín-Baró quanto Paulo Freire nos lembram
que a transformação social é alcançada por meio de uma educação crítica, dialógica e
comprometida com as condições culturais e sociais dos estudantes.
Nesse contexto, a formação docente precisa ser reestruturada para capacitar os
educadores a atuarem como agentes de mudança social. Mais do que ensinar conteúdos,
os professores devem ser preparados para promover o pensamento crítico e a autonomia
intelectual de seus alunos, reconhecendo e valorizando a diversidade de vozes que
compõem o tecido social brasileiro. Para tanto, o processo de formação docente deve ser
pautado por algumas diretrizes fundamentais.
Sugestões para o Processo de Formação Docente:
Currículo Crítico e Contextualizado: O currículo da formação docente deve
incluir disciplinas que abordem a diversidade cultural, étnica e regional do Brasil, além de
incorporar teorias críticas como a Psicologia da Libertação e a análise decolonial. Isso
permitirá que os futuros professores compreendam as realidades locais e estejam
preparados para mediar diálogos interculturais em sala de aula, promovendo uma
educação alinhada às necessidades dos estudantes.
Educação Dialógica e Emancipatória: Inspirada nos princípios de Paulo Freire,
a formação docente deve ser baseada no diálogo constante entre educadores e
educandos. Os professores em formação precisam ser incentivados a adotar práticas
pedagógicas que valorizem a participação ativa dos alunos, promovendo o protagonismo
estudantil e a construção coletiva do conhecimento. Dessa forma, a educação se torna um
processo de conscientização e emancipação.
Capacitação Contínua: Além da formação inicial, é essencial que os professores
tenham acesso a programas contínuos de capacitação que lhes permitam refletir
criticamente sobre suas práticas pedagógicas. Essa formação continuada deve incluir a
incorporação de novas metodologias e abordagens que respondam às demandas
emergentes das comunidades escolares, garantindo que os educadores estejam sempre
atualizados e prontos para enfrentar os desafios contemporâneos da educação.
Enfoque na Realidade Regional: Em regiões como a Amazônia, a formação
docente deve considerar as especificidades locais, incluindo a diversidade socioambiental,
os modos de vida das comunidades indígenas e ribeirinhas, e as questões de
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sustentabilidade. Os professores devem ser preparados para atuar em contextos de
vulnerabilidade social, adaptando suas práticas pedagógicas às realidades de cada
comunidade. Isso é essencial para que a educação promova o desenvolvimento
sustentável e o respeito à diversidade cultural.
Integração entre Teoria e Prática: A formação docente deve garantir que os
professores em formação tenham oportunidades significativas de aplicar os
conhecimentos teóricos em situações práticas. Estágios supervisionados em escolas de
diferentes regiões e realidades são fundamentais para que os educadores possam integrar
teoria e prática de maneira eficaz, desenvolvendo competências que lhes permitam atuar
de forma crítica e contextualizada.
Ao adotar essas diretrizes, a formação docente poderá transformar-se em um
processo verdadeiramente emancipador, capaz de promover a justiça social e o
desenvolvimento pleno dos indivíduos. A educação, aliada a uma psicologia comprometida
com a libertação e a equidade, pode contribuir para uma sociedade justa.
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